domingo, 18 de março de 2012

Berkeley Square - 1933

Um filme de reputação singular. Esteve dado como perdido durante décadas, e somente nos anos 70 foi encontrada uma cópia, da qual surgiram péssimas edições copiadas de exibições em TV – se alguém deseja ter uma noção é ir no You Tube, e constatar a porcaria . Menos mal que recentemente realizaram um trabalho de recuperação e hoje é possível conseguir cópia mais decente, guardadas as devidas proporções. Mas é sobre outros dois detalhes que repousa o seu lugar na história, ou melhor, nas histórias: da literatura e do cinema. Na primeira, porque era o filme favorito de Lovecraft, que o assistiu pelo menos quatro vezes, e lhe inspiraria a escrever a novela ”A Sombra vinda do Tempo”, para muitos, a sua melhor obra; o posto na história do cinema – independente de quaisquer qualidades – reside no fato, de que foi o primeiro filme a abordar o tema da viagem no tempo. O diretor Frank Llloyd, hoje meio esquecido, mas de reputação nos primórdios do falado, adaptou uma peça escrita por John Balderston, autor do roteiro também. Lembrando que este tem no currículo a peça teatral que inspiraria a primeira versão de Drácula, com Bela Lugosi, e dirigida por Tod Browning. Por sua vez, a peça foi inspirada numa novela de Henry James, “The Sense of the Past”.Filmes dos anos 30 podem assustar espectadores atuais: são mais estáticos, muitos diálogos, sempre em estúdios, e aqui neste filme não é muito diferente. Leslie Howard, um dos astros da época – atuaria em “O Vento Levou” – é um americano, na Inglaterra, que herda uma casa na Berkeley Square, e fica obcecado pelo antepassado homônimo proprietário da casa, que vivera lá após a independência americana. A obsessão acaba por fazê-lo crer que apenas com a força da mente, seria capaz de regredir à época do antepassado. Uma ideia que seria utilizada décadas depois no filme ”Em Algum Lugar do Passado”, baseado em romance do ótimo Richard Matheson. O filme abre com uma questão interessante: “quantos de nós desejariam poder fugir da monotonia e chatice do presente no glamour e romance do passado? Mas se pudéssemos regressar no mistério do passado, encontraríamos contentamento ou infelicidade?”. Quem viu o recente Woody Allen, “Midnight in Paris” vai lembrar que a premissa é a mesma.
E nosso herói volta, com a força do desejo, ao passado, na pele do antepassado. Não tarda muito em perceber que o passado não era fácil. O choque cultural é impactante: diferenças linguísticas assustam a todos, comportamento, hábitos – os ingleses se espantam com o fato dele tomar banho todos os dias – e terminam por tomá-lo por uma espécie de demônio, já que ele sempre parecia conseguir prever o futuro. E para piorar, seu ancestral estava prometido a uma moça chamada Kate, mas ele se enamora da irmã dela, a delicada Helen. Fica perdido entre as duas épocas: ao mostrar o futuro á amada, esta se horroriza com o que viu nos seus olhos e, sabiamente, prefere continuar no seu tempo. Só resta a ele regressar e permanecer infeliz e solitário esperando um dia se reunir à amada na eternidade. O maravilhoso “Peter Ibbetson”, de Henry Hathaway, realizado dois anos depois exploraria mais a fundo essa ideia do amor além da morte. Finalizando com o comentário de Lovecraft a respeito do filme: “É a materialização mais estranhamente perfeita das minhas próprias inclinações e pseudomemórias que já pude ver. Durante toda a minha vida tive a impressão de que eu poderia acordar desse sonho de uma era vitoriana idiota e da insana era do jazz na realidade salubre de 1760,1770 ou 1780...”. Como lembrei anteriormente o filme pode ser baixado no You Tube, mas a cópia é medonha, e não aconselho, mas no Pirate Bay tem um torrent com seeds bem melhor. Vale a curiosidade. Em 1951 seria refilmado por Roy Ward Baker com o título de “The House in the Square” e Tyrone Power no elenco. Um último registro curioso: no mesmo local, Em Berkeley Square, onde se passa a ação do filme, existe uma casa famosa por ser mal-assombrada.

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