quarta-feira, 27 de abril de 2011

Stranger at My Door- 1956


Parafraseando uma antiga máxima que diz- é nos pequenos frascos que se encontram os melhores perfumes ou os venenos mais letais- digamos que é nos pequenos filmes, que às vezes encontramos o grande cinema. E mais uma vez volto ao grande William Witney com esse western, “Stranger at my Door”, que qualifico de obra-prima absoluta. Para não dizer que estou sozinho nessa afirmativa vejamos o que disse Quentin Tarantino a respeito dele: “Eu mostrei esse filme para um grupo de amigos, todos gente do cinema, e ele deixou todos estupefatos. Ficamos discutindo-o por horas a fio”.

Baseado numa história de Barry Shipman, que também escreveu o roteiro. O elenco é bom:MacDonald Carey , Patrícia Medina, Slim Pickens e Skip Homeier. E foi nos estúdios da Republic.
No Brasil recebeu o título de “A lei do Revólver”. Como todas as grandes histórias estamos diante de uma trama aparentemente simples, que esconde meandros espantosos e complexos. Um bandoleiro dispersa seu bando após um assalto e busca refúgio em um rancho. O problema é que o rancho é de um pastor casado com uma mulher mais jovem. E tem ainda um garoto filho de um casamento anterior. O pastor descobre imediatamente a identidade secreta do visitante. O que se segue é um autêntico duelo, quase metafísico, entre a religiosidade e bondade do pastor e o cinismo e o mundo de violência do pistoleiro. Nos momentos em que o pastor vira as costas, o pistoleiro tenta seduzir a jovem esposa. “Madrugada da Traição” de Edgar Ulmer foi realizado um ano antes, e guarda alguns elementos em comum com o filme de Witney:em linhas gerais temos a mesma linha narrativa de um pistoleiro buscando abrigo em um rancho e tentando seduzir a esposa do rancheiro. O filme de Ulmer propunha uma releitura sutil do mito fáustico. Mas no filme aqui, em questão, estamos no terreno pantanoso e movediço da eterna luta entre o bem e o mal, que deixa este western em certos momentos com ares de um filme do dinamarquês Carl T. Dreyer. Vi esses dias “Ordet” e o final desse não difere muito do final do filme de Witney: em ambos vai se operar um milagre. Milagre também do cinema que nos proporciona obras simples e profundas como essa.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

The Woman they Almost Lynch- 1953


Tempos atrás em papo furado numa mesa de boteco com amigos cinéfilos o assunto recaiu em Allan Dwan. E eu disse: se havia alguém que eu desejaria ter vivido a vida (entre tantas outras) teria sido a dele. Ele fez mais de 200 filmes, começou a fazer filmes ainda no cinema mudo e só pendurou as chuteiras nos anos 60. Carreira longeva e como não podia deixar de ser, repleta de obras-primas. É verdade: muito diretor americano teve carreira igualmente longeva, mas nunca saiu da mediocridade. Deixemos seus nomes no limbo e exaltemos os bons, caso de Allan Dwan.
Um dos picos da carreira de Allan Dwan foi a parceria com o produtor Benedict Bougeaus já nos anos cinquenta, que resultariam numa sequência de obras primas nos mais diversos gêneros:, noir ,westerns e aventuras. Entretanto o filme que comento aqui pertence ainda à fase anterior, quando realizou filmes para a Republic. Fase de filmes baratos e rápidos. Pequenas obras-primas de concisão e estilo. ”The Woman They Almost Lynch” é um dos faroestes mais singulares de toda história. Compartilha com o badaladíssimo “Johnny Guitar” de Nicholas Ray (realizado um ano depois, também na Republic), a peculiaridade de ter como protagonistas as mulheres. Não em papéis de mocinhas chorosas e esperando o cowboy, mas como mulheres que empunham revólveres, saiam no tapa e tomavam a iniciativa. As semelhanças entre os dois filmes não param aí: as duas heroínas igualmente são proprietárias de saloon em ambos os filmes. No mais assumem pontos de vista estilísticos e temáticos divergentes. O filme de Ray é muito visto e comentado e louvado. O filme de Dwan não teve tanta visibilidade- e só mesmo o Santíssimo Cinemageddon, para achar uma pérola como essa, tendo em vista que o filme nunca edição em VHS ou DVD.
No filme de Dwan, acompanhamos a trajetória de uma mocinha Sally (Joan Leslie) que chega a uma cidade do oeste, em plena guerra civil. O povoado guardava várias particularidades: não tinha xerife, era neutra em relação ao sul e o norte e tinha como prefeito uma mulher. O irmão da moça proprietário do saloon local é morto numa refrega, provocada pela ex-amante, que o abandonou para ficar com Quantrill (Brian Donlevy). È então que entra em cena Kate, a amante de Quantrill, interpretada com brio por Audrey Totter. Quantrill, Kate e um ainda jovem Jesse James, são alguns dos personagens reais que aparecem na história( evidentemente com a liberdade histórica habitual de Hollywood). O foco da trama se concentra então na disputa entre a bandoleira Kate e a mocinha, que se revela uma exímia pistoleira e boa no muque também. As duas protagonizarão um dos raros duelos femininos do velho oeste. Cena regida com maestria pelo mestre Dwan, coroando um filme menor na sua filmografia, se comparado com suas obras-primas, mas nem um pouco desprezível. O epíteto de obra-prima não lhe fica mal.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

The Bounty Hunter- 1954


Último dos seis filmes estrelados por Randolph Scott com o diretor André de Toth. A série do ator com Boetticher é mais badalada e melhor. Isso não significa, entretanto, que essa série de westerns com o húngaro caolho não mereça atenção. E esse filme, exibido no Brasil com o título de “Feras Humanas” é seguramente o ápice estilístico e artístico da série. Foi realizado em 1954. Baseado numa história de Winston Miller, também roteirista do filme. O elenco traz duas ilustres presenças: Ernest Borgnine, num papel de coadjuvante e uma das rainhas do filme B, Marie Windsor.
O filme foi feito originalmente em 3D, mas acabou sendo lançado em versão normal. Explicam-se então alguns objetos voando em direção ao espectador.
Trama inventiva e eficiente: Randolph Scott é um caçador de recompensas contratado pela Pinkerton para encontrar três assaltantes de um grande roubo de trem. Os indícios sugerem que eles teriam se refugiado em uma pequena cidade, Twin Forks, e ele ruma para lá. A chegada dele instaura o pânico entre os cidadãos, com consequências imprevisíveis. Ecos do Macarthismo? Provavelmente. A trama lembrou-me outro western que resenhei aqui anteriormente “No name on the Bullet” (1959)de Jack Arnold. Scott está mais uma vez à vontade no papel do caçador solitário e ambíguo. Não muito diferente dos filmes que fez com Boetticher.
Bastam os planos iniciais para André de Toth, demonstrar que é um dos gigantes do cinema clássico americano. A abertura do filme serviria de inspiração para Sérgio Leone em “Era uma vez no Oeste” alguns anos depois. Talvez ele não tenha tido tanto reconhecimento quando os outros caolhos clássicos – Lang, Ford e Walsh- mas seguramente tem seu lugar reservado entre os grandes. Guerra, noir, westerns, capa e espada, terror, o húngaro de nascimento – que foi casado com a beldade Veronica Lake-, se deu bem em quase todos os gêneros. É só assistir essa obra-prima do cinema e do western para comprovar minha assertiva.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Una Rosa Per Tutti- 1967


José lewgoy ,numa ponta ,fazendo o papel de um livreiro socialista; Grande Otelo, no tradicional papel de malandro sambista; Claudia Cardinale, como uma garota carioca, mas falando italiano; um cantor de bossa nova (com a cara pintada de preto): e de quebra, Akim Tamiroff, como escultor, russo naturalmente. Roteiro baseado numa obscura peça de Gláucio Gill(falecido em1965). Essa maravilha existe e foi realizada pelo diretor Franco Rossi, do terceiro time da seleção italiana de cinema. Uma autêntica chanchada ambientada no Rio, como elenco quase todo italiano, falada em italiano, mas com ambiente brasiliani. Estupendo. Só o “Samba “ – que resenhei aqui anteriormente- com a Sarita Montiel, chegou perto no bizarro e no nonsense.
O filme foi exibido aqui? mistério. Apostava que não. Mas foi exibido sim, depois de pesquisar aqui na net e até alguma repercussão nas revistas da época. Afinal de contas, tinha um bom elenco. Seria uma pena senão tivesse sido. Aonde veríamos um carioca que não sabe comer churrasquinho de gato? Ou o médico atendendo uma paciente, num posto de saúde, possuída por um espírito depois de uma sessão de macumba nas proximidades de um cemitério? Definitivamente algo a ser conhecido. Napoli, Roma e Rio de Janeiro: tudo a ver. E no meio disso Cardinale desfila sua beleza e sensualidade, no papel de uma mocinha muito dada: em um dia ficou com uns 5 marmanjos – que são chamados de “primos” - e deixou outros babando. Valha-me Dios ! (Detalhe: ela é casada com um dono de um boteco na lapa). A chanchada tem seus momentos divertidos: a moça sai pela manhã e só chega a sua casa à noite, e o marido percebe que ela retornou com uma calcinha diferente. Ele questiona e ela retruca que a deu de presente( tsc tsc tsc). E Lewgoy, o livreiro, ensinando à ragazza quem é Dante Alighieri( que era justamente o livro que ela pegou na pilha de livros) - ah bom; Em outra cena num consultório de um médico ela pega uma estatueta da Loba com Rômulo e Remo, imagem símbolo italiana. Divertido também a sequência na boate : um trio de forró está tocando um baião e é interrompido por um conjunto meio bossa nova. Um dos raros instantes que aparece uma nesga de brasilidade real na trama.
O pano de fundo é um Rio irreal, quase um paraíso de comédia italiana. Inocência sexy. Rio onde uma moça podia andar a cavalo na praia ou caminhar à noite pelas ruas sem problema. Estranhamente o futebol é completamente ausente do cenário, exceto por um pôster de Pelé num bar da Lapa. Definitivamente esse é um Rio sui generis.
A rigor trata-se de uma chanchada italiana banal, salva pelo cenário carioca clichê(que o torna divertido para nós, como era de se esperar) e a beleza de Cláudia Cardinale, que faz o que pode para convencer como uma legitima carioca. Passa longe disso, mas tem seu charme.

sábado, 2 de abril de 2011

Macumba Love=1960


Nesse subgênero que criei dos filmes filmados ou com ação passada no Brasil e, realizados por estrangeiros, esse filme ocupa uma posição mitológica, O caso é que ele foi muito comentado e pouco visto. Filminho custoso de
encontrar. Não creio que tenha saído em dvd ou VHS E . Foi realizada em 1960 por uma pequena produtora americana em parceria com a Vera Cruz. A Revista O Cruzeiro publicou, na época da produção, uma ampla reportagem sobre o filme, destacando a participação da atriz Ruth de Souza, que tinha um papel de destaque, como uma feiticeira de vudu. A reportagem assinalava que o filme não tinha muito a ver com nosso país. Apenas havia sido filmado por aqui.
A história que envolve bruxaria, misticismo se passa em um país impreciso: uma mistura de Haiti e outras ilhas do Caribe com o Brasil. Politicamente incorreto ate o pescoço, como é de se imaginar. Bons tempos! As filmagens foram realizadas em uma praia de São Paulo ao que parece. Um escritor especializado em bruxaria chega a uma ilha ou país tropical, para investigar as manifestações religiosas nativas. Algumas mortes já haviam ocorrido na ilha e certamente tinham conexões com a religião local. A coisa desanda quando um casal chega ao país para passar a lua-de-mel. E a ex-donzela é escolhida pela bruxa local ( a nossa Ruth de Souza) para ser sacrificada. No elenco, ninguém muito importante à exceção da nossa grande Ruth. O diretor Douglas Fawley, de longa carreira como ator coadjuvante, despontou para o anonimato como diretor depois dessa produção. Aliás, foi seu único trabalho nessa seara. Já como ator teve longa carreira na TV. Como é de se imaginar estamos diante de um legítimo samba do crioulo doido, ou macumba para turista nenhum botar defeito. O resultado é surrealismo puro(que me perdoem Breton e Buñuel).
Algumas curiosidades: aqui o filme foi exibido com o título de “Mistério na ilha de Vênus”; outra e a presença ilustre de William Wellman Jr filho de um conhecido diretor americano, aqui num papel de destaque. June Wilkisson, a loura e heroína, chegou a ter alguma notoriedade como personagem de revistas de fofoca da época, mas como atriz passou em branco. Ela foi um dos subprodutos lançados na cola de Marylin Monroe e, que como se pode perceber aqui nesse filme curioso, não deu certo.