quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Lilith - Robert Rossen - 1964



“Lilith “foi o último filme na carreira do errático diretor americano Robert Rossen. Realizado em 1964 e recebido com frieza pela crítica americana. O astro do filme , Warren Beatty não ficou satisfeito com o resultado e manifestou seu repúdio. Abatido, Rossen se retirou do mundo do cinema e nao tardou em morrer algum tempo depois, encerrando assim uma carreira marcada por poucos e excelentes filmes. O tempo mostrou que a crítica americana da época , pra variar, estava errada, e hoje “Lilith “tem status de obra-prima. Não resta dúvida que o espectador tem diante de si uma obra poderosa, única e marcante. Nenhuma obra americana havia mostrado com cores tão fortes ate então situações de lesbianismo e pedofilia de maneira tão radical. E pra sermos francos,..nem depois. Creio que se fosse realizado hoje problemas de toda ordem com a censura velada que existe no cinema comercial americano aconteceriam.
Jean Seberg é a Lilith , uma paciente de um hospital psiquiátrico que tem seus talentos: pinta, desenha e faz música. Manipuladora enigmática, ela vai se envolver com Vincent( Warren Beatty) ex-veterano da guerra da Coréia, que trabalha no hospital como ajudante. O encontro desses dois jovens resultará numa história de amor estranha e e perturbadora como poucas . O rapaz, é aparentemente normal. Mas por alguns detalhes percebemos que a mãe era insana tambem e guardava ainda uma extraordinária semelhança com Lililth. Temos aqui o mais próximo que o cinema americano chegou da obra de Ingmar Bergman em termos de densidade psicólogica e requinte narrativo.
A abertura do filme sugere uma teia de aranha e mais tarde o personagem do psiquiatra irá a usa-la como metáfora para distinguir as pessoas normais dos esquizóides. A mise-en-scene de Rossen se faz com enquandramentos que sugerem e delineiam esta metáfora da teia e do comportamento esquizóide de Lilith que vai enredando todos ao seu redor.
O filme é curioso pela presença de futuros astros do cinema em pequenos papeis: Gene Hackman, numa única e excelente sequência : Peter Fonda, como um paciente apaixonado por Lilith e que Vincent induz ao suícidio.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Satánico Pandemonium - 1972



Um dos sub-gêneros mais peculiares que surgiu da exploitation, foi sem dúvida a nunsploitation , que como o nome sugere- NUN – trata do universo das freiras, Cronologicamente ele surgiu em 1971 com o lançamento do filme “Os Demônios”do loucaço cineasta inglês Ken Russell. O sucesso desse filme desencadearia uma onda de filmes que abordavam o misterioso universo dos claustros quase sempre sob uma ótica francamente sensacionalista e apelativa : muito sexo, geralmente sáfico, violência e terror- pois até freiras vampiras dariam o ar da sua graça. Mesmo cinematografias distantes do universo cristão, caso do Japão, produziram filmes sobre freiras ; nosso Brasil, também teve seu exemplar do gênero, “A freira e a tortura “ . Com “Satanico Pandemonium” temos um dos muitos exemplares desse sub-gênero , que teve seu apogeu na década de 70. O filme foi realizado no México em 1972, mas devido a problemas com a censura só seria exibido em 1975( diga-se de passagem que do mesmo país outro filme de sucesso no gênero seria realizado em 1978, “Alucarda “.) O filme dirigido pelo prolífico diretor Gilberto Solares , que tem no currículo mais de 200 filmes, rapidamente se converteria num dos mais destacados e interessantes pela maneira inusitada com que mergulhou no universo das freiras. E o resultado foi uma obra blasfema e surreal. Ecos da obra de Buñuel podem ser pinçados aqui e ali – pensemos na imagem do santo no altar sem os braços: imagem bunueliana por excelência - ; Marquês de Sade, outra presença onipresente ao longo do filme; Lautreamont e seus “Cantos de Maldoror “. A matriz do filme está na obra-prima do romance gótico inglês “O Monge “de Mathew Lewis, novela idolatrada pelos surrealistas e por Buñuel, que sempre almejou filmá-lo, tendo chegado a escrever um roteiro e, que , infelizmente não pôde realizar. De qualquer modo, o díscipulo e bíografo Ado Kyrou filmaria o roteiro na década de 70 com bons resultados. A obra de Lewis tinha como tema as tentações a que é submetido um virtuoso monge, pelo próprio Satanás, com consequências medonhas. No nosso filme em questão temos Soror Maria , . (interpretada pela bela Cecília Pezet) pura, virtuosa e admirada por todas as colegas. Nas sequências iniciais vemos este exemplo de virtude em meio a um cenário edênico : um bosque onde pastam ovelhas, os pássaros cantam e ela se distrai colhendo flores silvestres. E de súbito eis que diante dessa Chapeuzinho Vermelho,o lobo surge encarnado na pele de um misterioso homem nu. A aparição desse estranho – que logo ficará claro para o espectador que estão diante de Lúcifer em pessoa – que oferece à freira uma maçã e desencadeia uma reviravolta no universo até então puro da freira. O resultado será a derrubada dos muros do Jardim Do Éden e a entrada da freira nos prazeres do inferno. Estes prazeres que são simplesmente os prazeres da vida e mais alguns do mundo que Luzbel descortina para a freira e estão incluidos o inevitável lesbianismo, a pedofilia, o assassinato e até o sexo com o ele próprio. O que o Príncipe das Trevas faz é simplesmente rasgar o véu e desvelar por trás do religioso o que era simplesmente vaidade e carolice . Como no romance de Lewis . Um trabalho de certo modo fácil para Lúcifer.
Mais do que simplesmente explorar os elementos apelativos da história ,o filme demonstra uma curiosa preocupação com a crítica social : duas freiras do convento sao negras e realizam todo o trabalho pesado. Uma delas lamenta com Soror Maria , dizendo que fugiu da escravidão e buscou refúgio ali no convento e ao invés da liberdade encontrou uma vida mais dura e cruel do que tinha quando escrava. Algumas lendas curiosas cercaram o filme e a melhor delas dava conta de que os produtores contrataram prostitutas para interpretar as freiras do convento. A verdade é que estamos diante de um filme que transcendeu os limites do gênero e adquiriu status de cult com méritos. Basta dizer que Quentin Tarantino e Robert Rodriguez batizaram com o nome de Satanico Pandemonium a personagem de Salma Hayek no filme “Um Drink no Inferno “numa clara homenagem . Lá fora a “Mondo macabro”, produtora especializada em lançar dvds especiais, realizou uma ótima edição com vários extras , que infelizmente nao foi lançada aqui ainda. Menos mal que em vários sites de compartilhamento é possível baixar esta jóia cinematográfica. .

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Byleth -O Dêmonio do Incesto - 1972


Uma pequeno e obscuro exemplar do eurotrash dos anos 70, mais precisamente vindo da Itália, pródiga em realizar este tipo de filmes que combinavam erotismo acentuado, horror, violëncia e o que mais tivesse à mão para atrair público e causar impacto. Este filme foi dirigido pelo igualmente obscuro Leopoldo Savona, mais “conhecido”por haver realizado alguns westerns spaghetti lembrados apenas por fãs mais empedernidos. Fugindo completamente ao estilo acima, temos aqui outra típica producao pensinular do período e que fará o deleite dos apreciadores da exploitation . Para quem acha que cinema italiano é Fellini, Pasolini e cia ltda, melhor passar longe. Aqui temos um filme estritamente popular, como só os italianos sabiam fazer. e que causaria indignacão aos cinéfilos puristas. “Byleth – O dêmonio do incesto” tem nudez de sobra para os voyeurs, com belas mulheres se desnudando a todo momento; atores canastrões e uma trama que beira o nonsense e o incoerente às vezes. E apesar de tudo, que deleite este filme !

A trama é ambientada no sec 19 e traz elementos das narrativas góticas , emprestando ao filme uma atmosfera irreal , quase surrealista. Mark Damon, ator canastrão e conhecido por trabalhar até com Roger Corman, é Lionello, um nobre melancólico e que nutre uma paixão incestuosa pela irmã Bárbara (Claudia Gravy) . Após uma longa ausência ele retorna ao castelo da família e a encontra, agora casada.. Sua chegada coincide com o ínicio de uma série de misteriosos e brutais assassinatos de mulheres da região. Entramos então no terreno do giallo, gênero fecundo do cinema popular italiano do período. O filme se desenvolve de maneira contemplativa e ambígua: tudo pode nao passar afinal de contas de um produto da mente doentia de Lionello. Um pesadelo.

O filme foi uma dica do querido Carlos Reichenbach , em seu blog “Reduto do Comodoro” e que além de sempre indicar filmes raros como este, vez ou outra dispõe para o público de links para downloads de filmes especiais.

“Byleth”nunca foi exibido comercialmente no Brasil, ao que parece, mas é agora facilmente encontrado na internet para baixar. Quem tem gosto cinematográfico despido de preconceitos pode arriscar

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Curse of undead - 1959


Eis aqui um filme que sempre me atraiu por diversas razões Algumas razões de ordem afetiva que remetem à minha infância . A primeira vez que assisti este filme foi numa sessão noturna da TV Itacolomi, la na pequena Paraopeba, e como era de se esperar me impressionou vivamente aquele filme em que o pistoleiro era um vampiro e nunca mais aquelas imagens sairam da cabeça. Os anos se passaram e o nome do filme sumiu na memória, mas não algumas imagens. Já adulto, graças a um amigo cinéfilo, o mistério se desfez e foi revelado o nome do filme : “The curse of undead “. Um legítimo filme B e provavelmente a raiz do meu fascínio pelo universo do filme B. Uma viagem de férias a Nova York quatorze anos atrás me permitiu adquirir um VHs do filme. A busca por ele exigiu caminhadas pelas ruas do Village , entrando e saindo de pequenas lojas de filmes, ate que numa da Bleecker Street pude enfim reencontrar essa autêntica madeleine da minha infância. Já agora nos tempos digitais descobri com pesar que não este filme permance inédito no formato DVD . Com algum dose de persistência pude encontrá-lo para download num site de compartilhamento e pela terceira vez reencontrei esta pequena jóia do filme B. Estamos aqui diante de um dos filmes mais singulares desse universo tão particular pois trata-se de uma mistura de dois gêneros aparentemente opostos: o western e o filme de terror. Edward Dein, o diretor e também roteirista do filme, juntamente com a esposa, obviamente não tinha muito recuros para realizar o filme e teve que apostar num bom elenco encabeçados por Eric Fleming, no papel de Dan, e Michael Pate , no papel de Drake , o pistoleiro vampiro. Diga-se de passagem que Pate, oriundo da Austrália foi um renomado crítico teatral e e depois foi produtor cinematográfico e diretor de filmes, sendo inclusive responsável pela estréia no cinema do astro Mel Gibson. Além do bom elenco o recurso foi enfatizar o clima fantasmagórico com efeitos sonoros feitos por um teremin e a explorar o cenário desolado de uma cidade quase fantasma, onde praticamente não se vê nenhum ser vivo. A trama é relativamente simples: um estranho e soturno pistoleiro chega à cidade e é contratado pela mocinha Dolores, para cuidar do rancho. O namorado, Dan, que é tambem pastor da cidade, logo começa a perceber que há algo estranho com o pistoleiro e tenta dissuadir a namorada da idéia de mante-lo no rancho. O conflito é inevitável e leva ao inusitado duelo final entre um pastor e um pistoleiro, que se revela um vampiro. Sem dúvida um dos faroestes mais bizarros da história. Ainda ontem num encontro com amigos estavamos recordando alguns westerns com duelos bizarros e citamos este filme como digno de figurar numa hipotética lista dos dez mais do faroeste no quesito estranheza. Lembrando ainda que outra pérola B seria feita depois quase nos mesmos moldes : “Billy the Kid contra Drácula “, com John Carradine no elenco e que praticamente emulou a estrutura narravativa do filme de Edward Dein, com resultados inferiores, mas igualmente curiosos .

O Cangaceiro - 1970 -

Ao contrário do que eu havia presumido inicialmente não estamos aqui diante de uma refilmagem do clássico brasileiro do diretor Lima Barreto que tem o mesmo título. Estamos diante de uma obra ítalo-espanhola e com história diferente. Curiosamente a contracapa de uma edicao européia do dvd assinala que trata-se uma refilmagem. Nada a ver. Este filme que abordo aqui é um híbrido de gêneros que só o cinema italiano popular dos anos 60/70 era capaz de produzir. E aqui temos um filme de cangaceiros, como o título obviamente mostra, com elementos de western spaghetti, que naquele ano – 1970 – vivia sua fase de ouro. Filmado com certeza aqui no Brasil e , curioso , praticamente não tem ninguem daqui no elenco ou na equipe técnica, à excecao de uma espantosa e inusitada figuracão que por si só já tornaria o filme digno de nota : Baby Consuelo, a Baby do Brasil, entao vocalista dos Novos Baianos, fazendo uma ponta logo no ínicio do filme. Singular. filme de Giovanni Fago, diretor italiano obscuro e tambem um dos roteiristas do filme, ao lado do espanhol José Luiz Jerez Aloza, comeca com a trama clássica das histórias de cangaco: a vinganca. Espedito , quando tem ínicio a história , é um sertanejo simples, que após ver seu pai e sua vaca serem mortos pelos volantes, decide buscar sua vendetta. E faz questão de dizer que busca a vinganca porque mataram ..sua vaca. Hilário e bizarro. Salvo e curado por um ermitão, com tracos típicos dos beatos nordestinos, o rapaz se transforma numa espécie de andarilho místico pregando pela caatinga. Logo percebe, no entanto, que este não seria o melhor caminho e forma seu bando de cangaceiros. Thomas Milian, um ator de renome e atuante ate hoje, tem uma interpretacão a meio caminho entre o cômico e absurdo , que lembra Johnny Depp como o pirata maluco de “Piratas do caribe”. A questão política nordestina serve como pano de fundo da história. A exploracão do petroleo é a principal motivacão dos poderosos para massacrarem os cangaceiros e os camponeses. Sem dúvida o diretor buscou aqui inspiracao nos filmes de cangaco realizados por Glauber Rocha nos anos 60 e que tinham Antônio das Mortes, como personagem principal. Todo o filme tem uma aura quase surreal e barroca, involuntária as vezes. Sem dúvida, é o filme mais bizarro já feito sobre os bandoleiros nordestinos, aparte nosso nacional “Kung Fu Contra as Bonecas” (mas neste caso tratava-se uma comédia ) . Imaginem sò: em umas das sequências o bando de cangaceiro enfrenta gangsters americanos, trazidos da América, com metralhadoras e tudo ! Surreal ate a médula. Em outra sequência igualmente quase absurda , os camponeses de uma vila, desmontam o carro de um engenheiro e só deixam do mesmo a carcassa…. Outra sequência de destaque é a do baile oferecido pelo governador sacana aos cangaceiros: o jantar que comeca pomposo, ao som de uma orquestra tocando sonatas e valsas , termina com um forró alucinado, com serventes, cangaceiros, madames e o escambau , dançando pelo salão ao som da mesma orquestra agora envenenada com zamumbas e tambores. Até o arcebispo é flagrado batendo os pezinhos ao som do forró. Por um instante vislumbrei toques bunuelianos. Involuntário e insano. Só uma arte popular como o cinema permite este crossover entre popular e, digamos assim, erudito.Não pude averiguar com seguranca se este filme foi exibido no Brasil na época. Provavelmente não, haja vista o fundo político espinhoso para a entao ditadura militar. Comparado aos nossos filmes de cangaceiros que tambem viviam seu auge, esta obra estrangeira não faz feio, apesar da infelidade histórica e anacronismos. Nossos filmes do ciclo do cangaco tambem raramente primaram pela fidelidade. Com raras excecões tivemos faroestes disfarcados de filmes de cangaco. Troque as vestimentas e a trilha sonora e teremos um western como outro qualquer. O filme não é uma obra-prima do cinema: - trata-se uma obra cinematográfica dentro dos padrões do cinema italiano popular dos anos 70 e que agora estao sendo revalorizados e apreciados gracas aos blogs e cineastas como Quentin Tarantino e Robert Rodriguez , entre outros. Mas é um um fime digno de ser visto.
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