quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

The Muthers - 1976

Ciro Santiago(falecido em 2008) foi um dos gigantes do cinema exploitation entre os anos 60 e 70. Filipino, trabalhou com Roger Corman e Jonathan Demme entre outros. Produziu 79 filmes e dirigiu 77. O homem tem importância capital em vários subgêneros da exploitation. O maior estúdio cinematográfico filipino foi fundado por ele e está em franca atividade. Vou repetir o que já escrevi aqui antes: a indústria cinematográfica da pequena ilha asiática, colonizada pelos espanhóis, foi uma das mais prósperas e originais da Ásia. Diante de tantos filmes que Ciro dirigiu a escolha deste para lembrar aqui no meu cantinho inóspito se deve ao fato de que foi o último que andei assistindo nessa semana, e além do mais me divertiu à beça. Na verdade é um bom crossover de diversos gêneros que praticou da exploitation, o que o torna um filme digno de nota. O elenco feminino tem um punhado de beldades blacks que atuaram e ainda atuam: Jeannie Bell ,uma das rainhas da Blaxploitation , estrelou o clássico “TNT Jackson”, também dirigido por Santiago; Rosanne Katon- outra estrela negra da exploitation, apareceu na Playboy; Trina Parks ,foi Bond Girl em os “Diamantes são eternos”, e salvo engano também posou nua na revista do tarado Heffner; a quarta estrela do elenco, Jayne Kennedy, também deixou sua marca pela beleza. A trama , como disse, é uma suma de alguns subgêneros que fizeram a exploitation nos anos 70.
Começa como um filme de piratas moderno: o barco pirata “Muthe”, liderado por duas mulheres, ataca e rouba um barco de turistas bobos que faziam uma orgia. A irmã de uma das piratas desaparece posteriormente e na busca por ela recebem a notícia de que a moça estaria em uma prisão feminina, que também era uma plantação de café. Então o filme vira um WIP típico: um monte de mulheres maltratadas em uma prisão em plena selva, e o comandante sádico, aqui no caso, um bissexual enrustido. Vem então a inevitável fuga pela “jungle”, com os soldados no encalço das moças que escaparam, lutas de kung-fu, tiroteios e explosões. Uma trama movimentada e cheia de reviravoltas até o fim. A trilha groovy garante o clima blaxploitation . Para os que ficaram curiosos a dica é que existe o filme completo no youtube, sem legendas infelizmente. A chance desse filme sair em DVD por aqui algum dia é ,digamos assim, zero. O que no final das contas não tem nenhuma importância, talvez.

domingo, 20 de janeiro de 2013

El Asesino de Muñecas - 1975

Épater la bourgeoise”, velho lema francês que durante muito tempo fez sentido. Os poetas decadentistas do séc. XIX o tinham como profissão de fé. Espantar, assustar e impressionar os burgueses sempre. Os movimentos de vanguarda do início do séc. XX - surrealistas e dadaístas -seguiram com a bandeira. Neste início de séc.XXI nada mais causa espanto e a burguesia é só uma lenda urbana. No nosso imergente país - que muitos acham que é emergente - temos a classe C com seus funks , imprecações e urros pentecostais e corrida aos shoppings para adquirir o último gadget nos fins de semana. Tergiverso em demasia. Estamos a falar de um filme espanhol dos anos 70. O filme que Lúcifer teria produzido caso ele se aventurasse pelo cinema; dos mais afins, que tive oportunidade de ver, do espírito de Isidore Ducasse, o Conde de Lautreamont. O filme surrealista por excelência. Bem dentro do espírito espanhol, é verdade. As obras de Almodóvar e Bigas Luna certamente devem algo a este filme maldito, execrado e amado pelos “happy few”. Quando colecionava e devorava HQs europeias me impressionavam os autores espanhóis pelo humor cáustico e iconoclastia. É curioso observar que muitos cineastas ibéricos foram roteiristas de tebeos (os quadrinhos espanhóis), casos do citado Almodóvar e de Amando de Ossorio, entre outros. Miguel Madrid rodou somente três filmes. Este que relembro foi o segundo e o mais significativo. Não assisti ainda aos outros filmes que dirigiu, estão aguardando na longa fila. Ele foi roteirista de um filme que comentei aqui no blog há algum tempo: “As Amantes del diablo”. O próprio Miguel (que assinou o filme com o pseudônimo de Miguel Skaife) aparece no início anunciando a intenção da obra: um retrato de um psicopata, vítima da dupla personalidade. Paul (David Rocha) é um jovem estudante de medicina: péssimo aluno, expulso da escola (“tremendo desse jeito você será apenas um açougueiro”, diz o professor profeticamente ). Ironicamente tem aversão ao sangue. Os pais são jardineiros de um parque privado. Neste espaço bucólico, frequentado por casais de namorados e hippies, Paul exercita o assassinato como uma das belas artes, usando uma máscara de boneca e peruca (uma óbvia influência do giallo italiano). A proprietária do parque é a vistosa condessa Olívia, uma ninfomaníaca - interpretada por uma das rainhas do eurotrash dos anos setenta, Helga Liné - que ao conhecer o efebo convida-o para dormir em seu castelo e tenta seduzi-lo, sem sucesso. Paul não tinha, digamos assim, um interesse especial por mulheres. A mãe o criara como uma menina, obrigando-o a brincar com as bonecas da irmã morta antes de nascer. Além desse perfil andrógino a amizade com um garotinho chato que sempre brincava no parque possuía claros sinais de pedofilia. Outras perversões podem ser encontradas neste coquetel bizarro de insanidade como necrofilia e estatuofilia( tara por manequins) além da já citada pedofilia. Mas ocorre um encontro inesperado: conhece Audrey (Inma de Santis), a doce filha da condessa. A atriz Inma de Santis tinha menos de quinze anos de idade quando atuou neste filme rodado em 1973, e só lançado em 1975, obviamente sem sucesso algum. Interpretação histriônica e afetada de David Rocha - que depois chegaria a atuar com Luís Buñuel em “Esse Obscuro Objeto de Desejo”- beirando o paroxismo.
Obra desigual, excêntrica caótica e das mais delirantes e dementes da história do cinema ibérico. Daí o seu fascínio e sedução. Para driblar a censura franquista o diretor usou uma tática comum aos cineastas espanhóis da época: a ação se passava em um país estrangeiro, aqui no caso na cidade francesa de Montpellier. O filme foi rodado, no entanto, em Barcelona e Sitges. Falando nesta última localidade duas curiosidades: lá se realiza um excelente festival de cinema fantástico, e o fundador deste faz uma ponta no filme.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Pigs - 1972

Os anos 70 foram o ápice do cinema americano alternativo e B. Várias produtoras independentes já disputavam o imenso mercado exibidor que as majors desprezavam (drive-ins, grindhouses e cinemas de pequenas cidades) desde a década de 50. O resultado foram obras criativas, dementes, realizadas por diretores malucos e originais e que acabariam por influenciar o mainstream nas décadas seguintes. Marc Lawrence tem seu nome assegurado na história do cinema enquanto ator, e sempre como coadjuvante, desses que deixam impressão marcante mesmo que apareçam apenas em algumas cenas. Carreira incrivelmente longeva: atuou desde os anos 30 e chegou a trabalhar em “Um Drink no Inferno” de Robert Rodriguez(e produção de Tarantino) e viria a falecer em 2005. Para os cultores do filme B ele deixou dois filmes como diretor: o primeiro, realizado ainda na década de 60, mais precisamente em 1965, “Nightmare in the Sun”, um thriller com toques noir, estrelado por uma jovem Úrsula Andress; o segundo filme, já na década de 70, é este que relembro agora. Produção atribulada desde o início, pois o orçamento era inexistente. Reza a lenda que o filme foi realizado por Marc para servir de cartão de visita para a filha atriz Toni Lawrence , a estrela do filme. Fracasso de público quando lançado com o título original ”Daddy’s Deadly Darling” (recebeu ainda outros títulos) e rebatizado com o título atual, já em 1975, numa tentativa dos produtores de aproveitar a onda de filmes com animais assassinos deflagrada por “Jaws’ de Spielberg. Não adiantou muito, mas felizmente o filme ganharia edições em VHS e, mais recentemente, em DVD pela Troma. Edições ”meia boca”, mas as única possíveis até o momento. Ressalte-se que o título original é mais adequado para o que realmente acontece. Temos Lynn ( Toni Lawrence) que mata o próprio pai, depois de ser violentada, e é levada para um hospital psiquiátrico, de onde escapa disfarçada de enfermeira. A fuga em um fusquinha azul a leva até um vilarejo perdido na Califórnia, daqueles que os Mcdonalds e os wallmarts ignoram, longe do século XX. Nossa heroína arranja emprego como garçonete no único restaurante local, uma espelunca. O proprietário: um fazendeiro de nome Zambrini (interpretado pelo próprio Marc Lawrence) e de macabra fama junto aos vizinhos que diziam que ele alimentava seus porcos com carne humana. Boato, que logo no início do filme vemos que procedia. O alimento grotesco era adquirido de furtos no cemitério ou eventuais assassinatos. A relação que se estabelece entre o velho e a garota só poderia ser ambígua, incomum. Melhor para os porcos que passam a receber mais alimentos especiais já que Lynn coloca as manguinhas para fora e começa a matar: primeiro, uma paquera, depois um médico da instituição que a descobrira e tentara leva-la de volta.
Falei da produção precária e o fato é que o visual tosco até que combina com a orgia insana e indigesta que Lawrence oferece ao espectador. O blog é também serviço de utilidade pública e deixo aqui duas dicas : a primeira, gastronômica, vai para os apreciadores de uma boa feijoada , e que sempre confirmem a procedência da carne oferecida( ou melhor, da ração dos suínos) ; a segunda vai para os que ficaram interessados e chegaram até o fim da crônica informando que o youtube tem o filme completo(infelizmente sem legendas). O link aqui: http://www.youtube.com/watch?v=b9iguLopECs