domingo, 29 de abril de 2012

Nazareno Cruz y el Lobo - 1975

Meus dois primeiros posts, quando ainda hesitava sobre a falta de uma linha a seguir do blog, foram sobre filmes argentinos, o que, inclusive, levou-me a debochar de mim mesmo em um dos textos. Lendo ontem no metrô uma matéria interessante em um jornal sobre o cinema brasileiro e a crescente perda de público, foi lembrado que o último grande sucesso foi “Cidade de Deus” com 3 milhões de espectadores. Coincidentemente eram estes os mesmos números do filme argentino que relembro agora, quando pesquisava sobre ele para escrever esta resenha. Habitualmente é um dado que considero irrelevante, até por que escolho filmes de pouca memória, pelo menos aqui em Pindorama, e quase todos foram , ao que tudo indica, fracassos na bilheteria. O que realmente não tem importância. Este é portanto, ironicamente, o meu primeiro blockbuster que irei lembrar: 3 milhões de espectadores em 1975, somente na Argentina. A pequena Argentina que devia ter a população do estado de São Paulo ou menos, talvez. Não pesquisei este dado geográfico. E o que espanta não são os números, mas a qualidade artística do filme. E aí sim dá o que pensar e poderia aqui ficar divagando sobre o nível intelectual do povo argentino em relação a nós. Mas não ficarei aqui comparando os dois países. Mas que não me perguntem o que acho do cinema praticado hoje no Brasil, por favor. E quanto ao portenho, minha predileção vai mais para os cineastas populares e extremos como Armando Bó, Vieyra e Hugo Santiago entre outros, alguns dos quais até já relembrei filmes aqui. E sendo assim sobre o atual cinema de lá meu conhecimento é escasso igualmente, e muita coisa que vi mais recente não achei assim tão espantoso. Mas de qualquer maneira, bem melhores que nossos produtos despejados vez ou outras nos cinemas de shopping. Mas voltemos à história dos subúrbios, ou melhor ,ao meu filme do diretor Leonardo Favio. Um cara curioso, singular: imaginem se o rei Roberto se metesse a fazer filmes, e bons ainda por cima, de uma hora para outra? Foi o caso dele: paralela à carreira de cineasta se dedica(ainda), com sucesso à música romântica. Peronista assumido esteve exilado durante uma década regressando à terra natal em 1987.
E a maldita ditadura está no cerne desse filme. Nas palavras de Favio: “Este filme nasceu quando o país se debatia em saber quem eram os bons, quem eram os maus, todos discutiam se era peronista, se era de esquerda ou de direita, o que escolher e o amor estava perdido. Naquela época eram todos mesquinhos. A história de Nazareno me pareceu uma boa metáfora. É um filme que parte da minha ingenuidade de pensar que passando mensagens eu poderia apaziguar os ânimos”. Inspirado em uma peça radiofônica de Juan Carlo Chiappe. Narrada por Lúcifer em pessoa. Uma fábula cósmica e mítica que vai além do da recriação do mito licantrópico: metáfora da vida de Cristo. Nazareno nasce sob a maldição de ser o sétimo filho de um sétimo filho. E o diabo aparece e lhe faz uma oferta: todo o poder e a riqueza ao invés do amor que sentia por Griselda. Símile do episódio evangélico da tentação no deserto quando o diabo oferece a Cristo toda a riqueza e poder do mundo. Nazareno escolhe o amor e aceita o peso da maldição de se tornar a cada sete dias um lobisomem. Épico, brutal primitivo, romântico e popular. Na tragédia de Nazareno e Griselda temos o dionisíaco em uma plástica cinematográfica exuberante que não titubeia em recorrer ao kitsch quando necessário. Realismo mágico que parte das tradições populares e mitos ancestrais gauchescos e indígenas. Uma boa analogia talvez: o cinema do georgiano Paradjanov, e do polonês Zulawski . Antropologia transfigurada pela poesia. Um filme que não perdeu nem um pingo da sua força tantos anos passados e que merecia 3, 4, 5, 6 milhões de espectadores aqui e em todo lugar sempre.O detalhe é que o recorde de público do filme só foi quebrado pelo sucesso recente "El Secreto de sus Ojos".

Um comentário:

Anônimo disse...

cantou a dica certa! obrigado!