terça-feira, 29 de novembro de 2011

Living Skeleton - 1968

O cinema oriental, destacando-se ai o japa e o coreano, dita o que é bom e criativo no cinema de terror no mundo há bastante tempo. Qualquer produção de lá tem sido refilmada pelos americanos, obviamente com resultados inferiores. Este filme aqui até onde pude averiguar sequer foi exibido nos EUA na época do lançamento e nem mereceu ainda uma edição em DVD americana. Uma das razões, talvez pelo fato de ser em preto e branco num momento em que a maioria dos filmes já eram feitos em cores. O título inglês é evidentemente inapropriado, pois não tem nenhum esqueleto vivo no filme em nenhum momento. O título original tem mais a ver com “Bloodsucking Pirates” ou “Bloodsucking Skeleton Ship”. Mesmo sem repercussão na América, sua semelhança com o filme de John Carpenter “The Fog”, clássico dos anos 80, foi notada. O mais recente “The Ghost Ship” foi também claramente inspirado nele.
Com fortes elementos do cinema gótico italiano de Mário Bava, entre outros, temos aqui uma atmosfera fantasmagórica, irreal e ilógica, até surreal. A mise-en-scene maneja a narrativa com requinte. A sequência inicial é marcante: um barco capturado por piratas, e todos os passageiros e tripulantes são mortos sem piedade. Em seguida, o barco e abandonado e deixado à deriva no oceano. Salto para três anos depois, numa pequena cidade a beira-mar, onde o espectador toma contato com uma moça, irmã gêmea de uma das pessoas assassinadas no barco, que ajuda um padre católico na igreja local, e namora o dono de um restaurante. A aparição nas cercanias de um misterioso barco, envolto em brumas, atrai a moça. Com a ajuda do namorado ela vai ele e reencontra o fantasma da irmã e ao ler o diário de bordo fica sabendo de tudo o que ocorreu. Os piratas viviam agora, ali por perto também, como honestos cidadãos, e passam a ser perseguidos pela aparição do fantasma da moça.Um a um eles vão tendo mortes estranhas, ambíguas. Todas seriam talvez provocadas apenas pelo desespero causado por suas imaginações carregadas de culpa. E quem era a aparição? A mocinha, ou o fantasma da irmã? A narrativa deixa que estas questões permanecem na ambiguidade. Não há no filme, nenhum traço de uma ética e moral cristãs. O padre, que vai se revelar, aliás, como o líder dos piratas disfarçado é um monstro necrófilo, numa suprema provocação anticlerical. O coroamento do filme é uma sequência final onírica, desesperançada e niilista.
No elenco, a atriz Kiko Matsuoka teve alguma popularidade no exterior, atuando até em “ 007- Só se vive duas vezes”. O diretor, no entanto ,Hiroshi Matsuno permaneceu na obscuridade: o IMBD não lista nenhum filme dirigido por ele além desse aqui, o que é sem dúvida erro de informação, pois parece que ele foi prolífico diretor na TV e no cinema. A trilha é sensacional guardando algumas similaridades com as trilhas de Ennio Morricone com uso de harmônicas. Um filme que merece mesmo uma busca na internet: já é possível encontrá-lo com legendas em inglês, fato até há pouco tempo, impossível.
Antes que me esqueça: Kyuketsu Dokubo Sen, é o título japonês.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

The Body Beneath - 1970

Bem, se já lembrei aqui tantos malucos que dedicaram seus talentos a fazerem filmes tão loucos quanto suas vidas, como foram Ron Ormond, Al Adamson, entre outros, não poderia deixar de lembrar então Andy Milligan. Vida, assim como os citados acima, muito estranha e problemática. Americano de Minnesota mudou-se jovem para NY e foi parar na cena gay do Village aonde começou a trabalhar com teatro e logo teve a oportunidade de fazer filmes para o mercado exploitation que se desenvolvia para atender cinemas vagabundos e drive-ins. E sua carreira se moveu sempre nesse meio com filmes ultrabaratos, semiamadores, filmados em 16 mm, abordando toda sorte de perversões e loucuras, com 28 filmes, muitos perdidos(sobraram 14). Uma versão mais suja e punk do cinema de Paul Morrisey e Russ Meyer, na falta de analogia melhor. Stephen King referiu-se a um de seus filmes, pejorativamente, como “obra de um idiota com uma câmera”. O filme que lembro aqui tido como a sua “obra-prima”, se é que podemos usar este termo, pelos que comentaram sua obra. Andy Milligan abandonou NY por algum tempo, após receber convite de um produtor londrino e em Londres realizou três filmes filmados simultaneamente, um dos quais este aqui que resenho. Um filme de terror até convencional em linhas gerais. Ou quase, pois até onde sei é o primeiro vampiro que se disfarça de padre anglicano na história do cinema e ainda mora em uma igreja. Em todos os seus filmes, Milligan, assumia quase todas as funções por trás das câmeras: produção, cenografia, eletricista e até os figurinos, que assinava com pseudônimo.
A trama, até certo ponto linear, tem o vampiro disfarçado de reverendo e sua esposa(sempre muda), que chega a Carfax, procurando seus parentes. Sua linhagem estava definhando e ele precisava perpetuá-la, e para isso rapta três mulheres, descendentes do seu clã de vampiros, uma delas grávida. O plano era emigrar para os EUA e reerguer o clã de vampiros, usando a jovem grávida para gerar vampirinhos lindos e fortes. O séquito do reverendo incluía três vampiras psicodélicas e um criado corcunda, além da citada esposa, que funcionava também como um banco de sangue ambulante. Um corcunda não poderia faltar. Abrindo parêntese para uma lembrança pessoal: a única vez que o cronista aqui atuou foi justamente interpretando um corcunda, assistente de um cientista maluco (que era interpretado pelo cineasta Cao Guimarães) em um filme super -8 realizado como prova de um curso de cinema. Bons tempos. E é mesmo quase obrigatória em um filme B a presença do criado corcunda, não? Mas voltemos a “Body Beneath”: O clímax do filme é um banquete, onde todos os vampiros das redondezas aparecem, devoram uma mulher, enquanto debatem sobre mudar ou não para a América. O debate gera os momentos mais curiosos do filme, com diálogos bizarros onde os vampiros debocham sarcasticamente da América. Um dos vampiros diz que lá é era um país de gigolôs e prostitutas. Toda a sequência é filmada como se Andy Milligan estivesse possuído ou sob o efeito de LSD.

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Testigo para un Crimen - 1963

Novamente dando um toque sobre o cinema argentino, sempre ótimo. Meus dois primeiros posts foram sobre eles, e o primeiro havia sido sobre um filme do diretor Emilio Vieyra. Fiquei sabendo ontem que ele faleceu recentemente, e tô aqui agora relembrando outro filme que realizou. Este aqui foi seu terceiro filme, um dos dois que realizou com Libertad Leblanc, a rival de Sarli, nas imaginações pecaminosas dos latinos americanos da década de 60 e 70. Estava lendo em algum lugar, enquanto pesquisava sobre outro filme que pretendia resenhar, que a atriz esteve no Rio de Janeiro no fim da década de 60, foi ao programa do Chacrinha e até foi homenageada por Roberto Carlos e dançou com ele na TV. Ela tem um blog e comenta o evento. Emilio Vieyra deixou uma penca de filmes curiosos, alguns até mereceram edições americanas, com temas espinhosos e controversos. . Em sua obra o sexo, as drogas, o transexualismo, mas também uma visão política de direita( era anticomunista) são elementos constantes em filmes que iam do policial, erótico, terror até a ficção científica. Foi o primeiro a colocar em cena um travesti em um filme argentino, justamente no filme que resenho, isso em 1963. Um espanto para a época: hoje qualquer novela da Rede Globo tem um seja nas seis ou das sete, e não choca mais.
Apaixonado pelos filmes policiais americanos, hoje conhecidos como noir, Emilio Vieyra seria um equivalente no cinema ao que foi Robert Arlt na literatura argentina, guardadas as devidas proporções. Mas para muitos ele foi mesmo o Roger Corman argentino. Nada mal a comparação afinal de contas.
“Testigo para um Crimen” é um policial interessante. Começa até meio rotineiro. Martin, chega a Buenos Aires querendo vingar a morte do irmão. Os indícios o levam a uma boate cujo proprietário Otero, é um gangster e traficante de drogas, para quem o irmão trabalhava. Entra em cena Libertad no papel de Blondie, cantora e amante do gangster. Assumindo a persona de um milionário o rapaz ganha a confiança do gangster, torna-se amante da loura, tudo para desvendar o mistério da morte do irmão. À medida que o filme se desenrola o que parecia previsível se revela bem mais complexo. Além da trama com um final imprevisível, destaca-se a direção estilosa, com ângulos e planos inusitados. De brinde a beleza de Libertad Leblanc e uma ótima trilha de Victor Bochino, que insere aqui e ali acordes de bossa nova na trilha cool.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

The Bride from Hell - 1972

Casamento é mesmo uma coisa complicada, um passo que deve ser dado com muita ponderação, não é mesmo? Amor à primeira vista é muito bom, mas conhecer um pouco do noivo ou da noiva, seu passado, seus pais, seu modo de vida, vai ajudar bastante na hora da vida a dois. O cinema está cheio de exemplos de casais que se juntaram sem se preocuparem muito e o resultado foram desastres de todo o tipo. Meu filme que relembro aqui é um bom exemplo de um casamento às pressas e que terminou em muita confusão e sustos.
A literatura chinesa clássica é pródiga em narrativas de casamentos entre humanos e fantasmas. O clássico de Pu Song Ling “Chinese Stories from a Chinese Studio” traz uma penca de narrativas com essa situação, e os contos folclóricos também. Mas ,curiosamente o cinema chinês pouco explorou a riqueza das histórias clássicas de fantasmas. Somente após o sucesso de “O Exorcista” em 1974, é que os Shaw Brothers, maiores produtores de cinema da Ásia, e até então produzindo somente filmes de artes marciais ou espadachins, resolveram se aventurar pela temática. Mas só nos 80 oitenta seriam comuns as produções envolvendo histórias de fantasmas.
Yun Peng está viajando com seu criado e procura abrigo em uma casa isolada, com medo de fantasmas e bandidos. A mesma era habitada apenas por uma jovem senhora e sua criada. Apesar da recusa os viajantes se abrigam em um canto e vão dormir. No meio da noite Yun desperta e inadvertidamente descobre Anu, a jovem senhora, nua sobre o leito. Para evitar a sua desonra, a jovem exige o casamento. O pedido, apesar de tudo, não parecia mal, pois a jovem era linda e eles se casam mesmo Yun não sabendo nada do passado ou dos pais da moça . Após a cerimônia do casamento, os parentes do rapaz tem finalmente a oportunidade de verem o rosto da noiva e percebem assustados que tem algo de errado com ela, e fogem apavorados. A moça era um fantasma, e como de hábito, o marido é sempre o último a saber. Na verdade, a moça havia sido assassinada e estuprada vinte anos antes por um grupo de jovens, que agora eram respeitáveis cidadãos locais, e assumiu a aparência de uma bela moça para realizar sua vingança. E um por um eles serão mortos. O toque cômico é dado pelo criado gordinho de Yun, que também havia se casado com a criada da moça fantasma, e passa a acreditar que a esposa seria também do outro mundo.
Para os padrões atuais não é mesmo um filme que assuste: tudo sugere mais um conto de fadas mal assombrado. O bom é que, apesar de não ser uma obra-prima, a narrativa preserva o encanto das narrativas de Pu Song-Ling – que coincidentemente relia por esses dias uma coletânea de seus contos, traduzidos para o inglês – e daí o seu mérito principal. Uma curiosidade é que a atriz que representa Anu, a moça fantasma, Margareth Hsing Hui, depois de abandonar o cinema , se mudaria para os EUA, seria presa por tentar matar a própria mãe e faleceria em 2009.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

China 9, Liberty 37

“Quando eu fiz os dois primeiros westerns, eu estava realmente tentando fazer algo diferente, porque eu pensei que todo mundo já tinha feito todos os Westerns tradicionais que precisavam ser feitas. Então eu decidi fazer um par de anti-Westerns. E tendo feito isso, eu saí do sistema. Quando decidi fazer CHINA 9, 37 LIBERTY eu realmente queria um pró-western , um faroeste tradicional. E eu acho que fiz tudo com o melhor de minha capacidade. Eu acho que não chegou a ficar dessa maneira, mas eu dei o meu melhor.” –Monte Hellman

Para meu post de número 100, nada melhor do que relembrar gêneros, atores e diretores que aprecio: no caso tenho aqui um faroeste – talvez meu gênero favorito, um diretor de minha particular estima: o americano Monte Hellman, e o ator fantástico – impossível evitar um superlativo no caso dele, Warren Oates. E de quebra, este filme ainda tem uma ponta rara de Sam Peckinpah, outro dos meus diretores favoritos de todos os tempos. Um faroeste classificado pela maioria, como um spaghetti, pela razão da produção italiana e as filmagens, além do mais, realizadas na Espanha e na Itália, cenário habitual do subgênero. Quando foi lançado em 1978, o western estava praticamente morto: nem os italianos se aventuravam mais pelo gênero, e nos EUA poucos filmes eram realizados. Se em termos de produção ele pertenceria à infame escola italiana, a rigor o diretor fez mesmo, conforme sua declaração citada na abertura da resenha, um faroeste dentro das tradições clássicas americanas. As duas incursões anteriores de Monte Hellman no western, ambas filmadas nos anos 60, tendo Warren Oates em uma delas (“The Shooting”), foram tentativas de renovação inseridas dentro do contexto das mudanças que ocorreriam nos anos 60 em todos os setores da arte e da sociedade. A crítica os apelidou de faroestes psicodélicos. Monte Hellman sempre manteve uma carreira à margem da indústria cinematográfica americana. Começou trabalhando em filmes baratos com Roger Corman ,depois só conseguiu realizar esporádicos longas-metragens. A sina errática de Monte Hellman continuaria após este filme: somente dez anos depois conseguiria finalizar outro filme,“Iguana”.
E incrivelmente, depois de 20 anos sem dirigir, lançou em 2010 o filme “Road to Nowhere”, com boa aceitação crítica. O filme, segundo o diretor, foi inteiramente filmado com uma câmera digital que custou USD 12.000!
“China 9, Liberty 37” (na Itália se chamou “Amore, Piombo e Furore) o estranho título americano se refere a um cruzamento entre duas pequenas cidades do oeste. E metaforicamente, como veremos, o filme é sobre o cruzamento entre diversos tipos de heróis e bandidos do velho oeste. Temos então um pistoleiro Clayton (Fábio Testi) condenado á forca, no vilarejo China, que recebe uma oferta que poderia livrá-lo da condenação: matar um mineiro que estava atrapalhando os planos de expansão da ferrovia. Mathew, o rancheiro, em mais uma boa e singular atuação de Warren Oates , em um dos seus últimos papéis , vivia no rancho com uma bela mulher, a insatisfeita Catherine(Jenny Agutter) e havia sido um pistoleiro de aluguel para a própria companhia que desejava eliminá-lo. Clayton chega ao rancho, mas acaba fazendo amizade com Mathew, além de cair de amores pela esposa dele, e vai embora sem realizar a tarefa assassina. É claro que não sem antes ir às vias de fato com a bela esposa do rancheiro marrento. A consequência é que o marido espanca a mulher , mas acaba sendo ferido gravemente por ela. Catherine acreditando-o morto foge e vai à procura do amante. Recuperado, o rancheiro inicia uma perseguição, com a ajuda dos irmãos, ao casal. A narrativa vai descortinando detalhes que demonstram originalidade: é raro como aqui, por exemplo, ênfase em cenas de amor e sexo, no gênero; a psicologia dos dois pistoleiros é rica em nuances: nenhum é mocinho ou vilão realmente, e apesar da rivalidade brutal ( todos os irmãos do rancheiro são mortos ) a amizade entre o pistoleiro, ainda na ativa, mas querendo fugir da profissão, e o pistoleiro aposentado, sobrevive de alguma maneira. Há uma intervenção quase felliniana de um circo em um vilarejo no deserto; o proprietário, além de oferecer ao pistoleiro um trabalho no circo como atirador, lhe dá algumas garrafas de um elixir à base de cocaína. Uma alusão aos primórdios da Coca-Cola? E temos Sam Peckinpah que aparece como um escritor de romances vagabundos de faroeste, que se oferece a Clayton para escrever suas façanhas e transformá-lo em uma lenda do oeste; e ele é claramente citado e homenageado na abertura do filme, similar à “ Wild Bunch”, onde meninos brincando com escorpiões apareciam nas sequências iniciais, agora são meninos brincando com bolinhas coloridas. Em suma um faroeste que vai além de ódio, vingança: é também uma história de amor e amizade destinada ao fracasso, uma ode crepuscular e melancólica a um gênero agonizante, simbolizada nas figuras dos dois pistoleiros. Temáticas, na verdade, presentes em toda a rica e pequena filmografia de Monte Hellman. Foi simbolicamente a última produção distribuída pela Allied/Monogram, clássica produtora e distribuidora de filmes B nos anos 50 e 60, homenageada até por Godard em “Acossado”. O responsável pela fotografia foi o grande Giuseppe Rotunno de “O Leopardo”, entre outros clássicos.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

5 de Chocolate y 1 de Fresa - 1967

Que tal juntar num caldeirão Richard Lester, 3 Patetas, Jerry Lewis, Buñuel, Frank Tashlin, John Waters e Almodóvar e acrescentar doses fartas de psicodelia sixtie à lá Austin Powers ? Essa maçaroca analógica poderia dar uma ideia dessa comédia mexicana para o leitor. A direção coube a Carlos Velo, 45 filmes no currículo, em sua maioria documentários, além de haver trabalhado com Buñuel em “Nazarín”. Um veículo inusitado para Angélica Maria, uma mistura de Dóris Day e Wanderleia mexicana. Na verdade ela nasceu em New Orleans nos EUA, mas fez sucesso no México cantando, atuando ( desde criança) e apresentando programas de TV; está ainda na ativa, popularíssima no país asteca. Ficou conhecida como a namorada do México, tal a sua popularidade. O papel que interpreta aqui causou, é claro, alguma polémica e foi audacioso. No inicio do filme tudo parece estar ok: ela é uma noviça ingênua em um convento, os pombinhos voam ao seu redor e até pousam sobre a sua cabecinha dourada. Mas de repente eis que ela está com outro visual, minissaia, cabelos compridos, cara safada e descendo as escadas de uma festa de ricaços cantando um rock’roll doidão para os padrões da época. O que se passou? Bem, a noviça havia experimentado no convento uns cogumelos alucinógenos, deu uma pirada e se transformou na maluquinha e sexy Brenda. Na festa ela arrasta consigo 5 playboys, e com pistolas de brinquedo, passa a cometer uma série de ações criminosas malucas. Em seu encalço surge uma organização bizarra chamada Agência de Vigilância Internacional e o filme se transforma num jogo de gato e rato que vai ficando mais e mais maluco, até abandonar a lógica completamente. Os efeitos alucinógenos pelo visto também afetaram diretor, roteirista e atores. Fiz no início da resenha algumas analogias, acrescentemos também às anteriores “Diabolik” de Mário Bava, e a série “Batman” com Adam West.O barato é que em meio a tanta maluquice aparentemente inconsequente as piadas e tiradas passam longe da caretice: igreja, exército, burguesia mexicana, cada um recebe o seu piparote maroto. Ou seja, o filme vai além da comedia juvenil e por alguns momentos - mais uma analogia - parece que o espectador está diante de algum rascunho de um filme de Buñuel, um “Fantasma da Liberdade” talvez. Uma pena que a cópia que tenho foi ripada de TV e não é das melhores. Até onde sei, não saiu em DVD, infelizmente, nem no México e ou outro lugar. O que é de se estranhar, considerando que foi o auge da namoradinha asteca no cinema.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Sigfrido - 1957

Uma versão italiana para a lenda de Siegfried e os Nibelungos foi mesmo algo que eu não imaginava encontrar algum dia. Eu conhecia versão genial de Fritz Lang, que tive o prazer de assistir no antigo cineminha do Goethe Institut; descobri que, posteriormente, os alemães fizeram outra versão da lenda, já nos anos 60. Infelizmente ainda não a consegui com legendas legíveis, já que não entendo lhufas da língua de Goethe. Mas esta versão dirigida por Giacomo Gentilomo em 1957 me era inteiramente desconhecida. Bati na madeira. Um peplum de uma lenda germânica? Bem, infelizmente deveria ter dado mais pancadas na madeira. Adoro a história: li a Saga Islandesa, com a lenda original nórdica, “A Saga dos Volsungos”, li depois “O Canto dos Nibelungos”, poema alemão escrito na idade Média, e já com influência da literatura do ciclo arturiano. A história me fascina desde criancinha, pois ganhei uma coleção em 7 volumes só com narrativas de mitologias do mundo todo, e um dos volumes era dedicado à lenda de Siegfried e sua espada mágica. A produção italiana já apresenta os cacoetes do gênero peplum que ganharia força na década seguinte e inundaria os cinemas com gladiadores, heróis mitológicos, monstros, deuses, imperadores romanos e muito mais. Como eu temia, os roteiristas tomaram muitas liberdades com a história original: ignoraram o início da saga, aonde se narrava a história dos Volsungos, a morte de Sigmund, pai de Siegfried, e ignoraram o espetacular final com a vingança de Kriemhild, entre outros vários detalhes. O herói Siegfried é aqui neste filme um guerreiro aborrecido, fanfarrão e francamente estúpido: não tem nenhum cuidado em revelar o segredo da sua invulnerabilidade para Hagen, seu inimigo! Francamente, o rapaz era um tolo e paga caro por isso. Teria sido pior, é verdade, se os americanos tivessem realizado a adaptação, sem nenhuma dúvida, não? Apesar dessas mudanças, o básico da lenda, que, aliás, tem várias versões, é preservado e o filme tem seu encanto. Não chega aos pés dos filmes de Lang, quase desnecessário frisar, fica claro que o diretor tentou ao máximo emulá-los em várias sequências, sem muito sucesso: a obra de Lang foi, afinal de contas, uma superprodução, fascinante em todos os aspectos, e a italiana teve uma produção bem mais modesta.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Embla - 1991

A Islândia que sugere magia, vikings, deuses nórdicos, sagas, uma neve infinita, Bjork, é um país pequeno e produz também bons filmes. E o mais interessante: filmes com temática medieval, que buscam recuperar o passado quase mítico da ilha. Narrativas baseadas nas lendárias sagas, o primeiro opus em prosa que o ocidente produziu. Este filme que resenho é o segundo que assisti originário do país. O primeiro, aliás, depois de ler uma saga, soube que haviam feito uma adaptação cinematográfica na Islândia. Com a curiosidade aguçada passei a fuçar a net, e infelizmente descobri que achar o filme seria impossível. Existia até um edição dele em dvd lançado na Europa, mas com subtítulos em russo. O filme em questão era “Utlaginn”, que eu acabaria já no ano passado conseguindo uma cópia, inicialmente sem legendas, ou seja, inútil quase, mas pouco depois consegui as legendas em inglês. Mas deixemo-lo para depois. E concentremo-nos nesse interessante filme também ambientado em um período medieval, mas ao que tudo indica não foi inspirado em nenhuma saga. Embla, também recebeu o título de “White Viking”. Os dois títulos exemplificam os percalços em torno da produção: Incialmente lançado como “White Viking” tinha uma metragem maior, e um desenvolvimento contrário às ideias do diretor, modificado pelos produtores em vários aspectos. Esta versão centrava-se mais na história do personagem masculino e sua viagem á Islândia para converter os pagãos ao cristianismo. A posterior mudança do título e a remontagem do diretor, justamente mudava o foco da trama para a personagem Embla, a mulher do rapaz enviado à Islândia, e eliminando substancialmente o papel do personagem masculino. A primeira versão foi lançada em 1997, e só em 2007, a versão do diretor foi exibida. Hrafn Gunnlaugsson, é um diretor especialista em retratar o passado heroico e mítico islandês, tendo realizado uma elogiada trilogia, conhecida como “Trilogia do Corvo” do qual este aqui seria a terceira parte e é tido como o responsável por colocar o cinema islandês no mapa mundial. A atriz Maria Bonnevie no papel do título tinha apenas 15 anos na época, de origem sueca, tem feito uma carreira internacional de destaque desde então no cinema europeu. Sua participação causou polêmica, tendo em vista as várias cenas de nudez e sexo que protagoniza. No chatérrimo politicamente correto de agora seria impossível.
A trama é ambientada nos tempos do rei Olavo - no século 10 - responsável por introduzir o cristianismo nos países nórdicos. Como veremos no decorrer da narrativa, essa conversão não se deu de maneira pacifica , usando a força da espada e envolvendo banhos de sangue. E é durante a cerimônia pagã do casamento de Askur e Embla, que as tropas do rei chegam, e massacram a todos. A moça é capturada, seu pai, um sacerdote pagão é obrigado a se tornar um padre, e seu noivo é condenado a partir até a Islândia, ainda pagã, e convertê-los ao cristianismo. Só dessa maneira poderia reaver a noiva. Mas o rei Olavo se enamora da orgulhosa viking e tenta de todas as s maneiras seduzi-la e a aprisiona em um convento isolado. Ao contrário de produções americanas pretensamente históricas, não temos aqui anacronismos absurdos comuns nos filmes antigos e recentes. Temos uma narrativa de um realismo feroz, nenhum glamour, numa secura e aspereza que deixam tudo com um aspecto quase documental , apuro e fidelidade histórica em cada detalhe: vestuário, comportamentos dos personagens. O painel que ele desdobra para o espectador é o de um cristianismo quase selvagem e bárbaro, chocante para os desavisados.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Íncubus - 1966

Um dos filmes mais cercados por lendas de todos os tempos, e dos mais curiosos e obscuros. Para começar foi um dos dois únicos filmes falado inteiramente em esperanto até hoje. Eu até achava que era o único, e a maioria das resenhas dizia que seria,mas foi realizado antes na França, outro falado em esperanto. Lendas de maldições cercam o filme: praticamente todo o elenco, à exceção do star trek William Shatner, morreu de maneira trágica após a realização. E para finalizar: só teve exibição na França – daí porque qualquer cópia que alguém encontrar sempre terá legendas em francês –, foi dado como perdido e só há alguns anos foi encontrada uma cópia e enfim, o ganhou versão, lá fora em dvd.
O responsável por essa curiosidade da história do cinema foi um homem mais afeito ao universo da televisão, curiosamente: Leslie Stevens dirigiu pouquíssimos longas-metragens, tendo trabalho como produtor, diretor e roteirista na TV. Seu nome sempre é lembrado por ser o responsável pela série “Além da Imaginação”, umas melhores coisas que a TV produziu.
A decisão por colocar os personagens falando em esperanto foi uma audácia de Leslie Stevens, mas faz algum sentido, considerando a trama. Dois demônios Amael e Kia , em forma de mulher, entediadas com a facilidade com que os humanos se deixam levar para o mal. Kia descobre que um humilde soldado que vive numa ilha isolada , envolta em brumas, com a irmã era, afinal de contas, alguém realmente puro, e resolve, junto com a irmã concentrarem as forças em levá-lo para o caminho do mal. Para corromper a irmã recorrem a outro espírito do mal que vai seduzir e estuprar a moça ; mas Kia e o soldado se enamoram. Para o diretor então só faria sentido que os íncubos falassem uma língua que não soasse como falada por humanos, e daí escolheu o esperanto. O cenário nas cercanias de Big Sur, na Califórnia, sugere mais uma atmosfera expressionista e nórdica, uma aura onírica e de pesadelo. Um episódio da “Além da Imaginação” com toques bergmanianos alguns críticos sugeriram. As imagens e temas influenciariam diretamente três filmes posteriores: “O Exorcista” – os demônios de ambos os filmes se assemelham -, “Evil Dead” de Sam Raimi e “o Bebê de Rosemary” ( a cena do estupro demoníaco é similar à cena do filme de Polanski).
Voltando ao tema da maldição que cercaria o filme: as duas atrizes, que interpretaram os demônios tiveram fim trágico um ano após a realização do filme: Ann Atmar suicidou e a outra Eloise Hardt, teve a filha raptada e morta; e o ator Milos Milos que interpretou o demônio matou a amante, esposa do ator Mickey Rooney e cometeu suicídio em seguida. A questão é - para além dessas lendas - que estamos diante de um filme de terror sui-generis, que não deixa ninguém indiferente ao assisti-lo.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Moonrise - 1948

Falar que este filme é a obra-prima de Frank Borzage seria uma leviandade da minha parte, afinal ainda estou descobrindo a obra – imensa – desse diretor americano. Começou no cinema mudo e fez carreira até o fim dos anos 50, ou seja, tenho muito filme ainda dele para descobrir e posso mudar essa afirmativa, e de resto nada mais chato que afirmativas. Mas este filme é maravilhoso, e se não é a obra mestra de Borzage, fiquemos a imaginar então o nível de suas obras-primas. Já no final da década de 40 quando dirigiu este filme há muito Borzage deixara seu auge criativo, segundo os críticos: seu pique artístico teria sido do cinema mudo até o final da década de 40.
O filme é classificado por muitos como um filme noir. Sim, temos um crime, temos luzes e sombras, temos o sentimento de culpa. Mas não temos a mulher fatal, não temos o mocinho, o cara mal, não temos o cinismo e o desencanto típico do filme noir, muito menos o ambiente urbano soturno. A história se passa em uma pequena cidade do sul dos EUA nos anos 30. Temos apenas um rapaz comum Danny (Dane Clark), que carrega um peso nas costas, uma marca medonha: o pai foi um assassino, condenado à morte, e todos na cidade fazem questão de jogar isso na sua cara desde quando era um garoto. Uma letra escarlate ou uma chaga de fogo que o persegue e que o leva numa briga a matar acidentalmente um rapaz, o playboy local, rival da sua paixão, Gilly (Gail Russell) . A estética expressionista alemã nunca esteve tão presente neste filme em seu jogo de luzes e sombras, que pontua o calvário do rapaz. Esplêndida sequência inicial, cinco minutos praticamente sem diálogos, que demonstram todo seu pathos expressionista. A herança de Murnau, de quem Borzage herdou o estilo: é evidente que o filme deve muito à “Sunrise”.
O crítico Andrew Sarris classifica o diretor como uma dos mais elusivos da história do cinema. E no livro “The American Cinema” ele lembra que :“ Muitos dos projetos de Borzage, especialmente no fim de sua carreira, foram indiscutivelmente triviais na concepção, mas a personalidade do diretor nunca vacilou, e quando a gloriosa oportunidade de ‘Moonrise’ se apresentou Borzage não se sentiu velho ou cansado”.
O filme realizado em condições modestas de orçamento foi um fracasso, atribúido a dificuldade de enquadrá-lo em um determinado gênero. O estúdio tentou vende-lo como um drama romântico, mas a estética expressionista e ausência de um herói dentro dos arquetipos hollywoodianos afastaram público e crítico. O filme apresenta detalhes interessantes: é um dos raros filmes do período a apresentar um ator negro, Rex Ingram, em papel de destaque e de maneira positiva: ele funciona como a consciência de Danny. Foi inclusive tido como o melhor papel escrito para um ator negro até então. O personagem quase filosófico do xerife, que procura descobrir o criminoso é outro dado curioso. Mas é na sua mise-en-scene romântico-expressionista que o filme se transfigura: Borzage foi sempre um saudosista dos tempos do cinema mundo, onde a expressão visual era essencial, e em “Moonrise” mais que em outros de seus filmes pode dar vazão ao seu fascínio. “Com os cartões de título substituindo o diálogo, poderia ter sido o maior filme mudo jamais feito por Borzage”, observou um crítico americano.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Un Angelo per Satana - 1966

Não é seguramente o melhor filme estrelado por Bárbara Steele, mas tem seus atrativos e peculiaridades. Foi, por exemplo, seu último filme no cinema que a consagrou: o italiano. Inglesa, fez fama na Itália, com apenas 21 anos,  quando estreleou a “A maldição do Demônio” de Mário Bava, clássico do terror; e em seguida estrelaria uma série de filmes no gênero, com escapadas para trabalhar com Fellini em “Oito e Meio”, mas  invariavelmente acabava retornando  ao gênero.  Da Itália, já consagrada como rainha do terror, voltaria á Inglaterra e EUA, quase sempre... em filmes de terror, até que deu um basta e abandonou o gênero, declarando que não queria mais  ficar saindo de caixões esquisitos. Camillo Mastrocinque  foi diretor,  e um dos roteiristas, dessa última incursão italiana de Steele no terror. Mais uma vez uma ambientação gótica. Para contracenar com ela um ator com  vínculos brasileiros, o ator Anthony  Steffen, filho de um embaixador brasileiro em Roma, inclusive tendo falecido aos 74 anos no Rio de Janeiro em 2004.
O cenário é uma aldeia italiana a beira de um lago, no século 19. O nobre local retirou do lago a estátua de uma antepassada. Um escultor, Roberto (Steffen) é convidado para restaurá-la. Ao  mesmo regressa ao castelo a sobrinha do conde, Harriet (Bárbara Steele) , que apresenta uma extraordinária semelhança com a estátua. As mortes começam a acontecer e os aldeões creditam estas mortes  a uma  antiga maldição ligada à ela. A nobre retratada, Belinda, fora uma mulher cruel e sanguinária. Não demora muito para que a sobrinha comece a apresentar sintomas claros de que está possuída pela antepassada. Mais uma vez Steele demonstra seu talento em um papel duplo, assim como havia feito em outros filmes: sensacional a maneira como ela com apenas um olhar e entonação de voz se transfigura em outra persona. Da doçura e inocência para a crueldade e perfídia, acompanhada de uma sensualidade predatória: a sádica possessa vai,, graças aos seus atrativos sexuais atraindo os homens  ao redor, seja um professor da  escola da aldeia, um jardineiro retardado, um aldeão  tosco,  e até uma mulher, para atingir seus objetivos. A trama aparentemente previsível em seus contornos góticos acaba  revelando inesperadas soluções, que vão surpreender o espectador que se deixar enredar nesse neste bom filme.

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

The Legend of Lylah Clare - 1968

Um filme fracassado pode ter seu encanto e ser mais significativo que um grande sucesso. E este fracasso pode ser apenas uma  questão de ponto de vista, modismo  crítico. A bomba de ontem  pode ser o cult de hoje.  Mas, acima de tudo um fracasso artístico  ou de bilheteria pode ser iluminador: é como uma estátua, que o escultor não deu o toque final e deixou largada em um porão, e por algum motivo,  daí foi tirada e colocada  em um  jardim, daquele jeito mesmo, mal acabada, mas emanando um fascínio, de algo que poderia ter sido mas não foi.  Esse filme de Robert Aldrich é um desses casos.  Em sua filmografia é fácil encontrar um punhado de sucessos de público e de crítica, filmes que hoje são clássicos em gêneros distintos como faroeste, noir , drama ou terror. Mas aqui, no entanto estamos diante de  um fracasso em todos os sentidos, uma estátua quebrada que tem seu fascínio, esboço de uma obra-prima que  não aconteceu. Temos a magnífica estátua de deusa grega Kim Novak, reluzente em “Vertigo”  “Picnic” e outros filmes, e aqui em seu último papel no cinema americano. A atriz vinha de dois fracassos, um deles uma obra-prima incompreendida na época, “Kiss me Stupid” de Billy Wilder. Então podemos pensar que a presença dela é que salva o filme? Pelo contrário, sua atuação aqui foi ruim, quase mecânica, onde ele exibiu seus piores cacoetes de má e linda atriz. Mais do que nunca, aqui ela foi uma estátua, mas sua beleza redime, sem dúvida.
Kim Novak  é Elsa, uma jovem atriz, que se vê subitamente jogado na selva de Hollywood pelas mãos de um produtor, interpretado por Ernst Borgnine, que a projeta como a atriz perfeita para interpretar uma antiga diva do cinema dos anos 30, Lylah Clare. E para dirigir o filme convoca  o ex-marido da estrela morta, um  diretor alcoólatra e fracassado, interpretado por Peter Finch. À medida  que as filmagens vão se desenrolando, mais e mais Elsa vai confundindo sua persona com a de Lylah, até atingir um ponto, que sua personalidade desaparece e a própria Lylah parece renascer. Entramos aqui quase no  terreno de um filme de terror psicológico sub-bergmaniano. A trama  mergulha  - numa atmosfera decididamente camp, quase surreal e barroca -, no universo  de Hollywood, com suas colunistas, produtores, egocentrismo, alcoolismo, perversões sexuais:  Aldrich, infelizmente não tinha a loucura de Russ Meyer, e  assim o  filme vai  tergiversando entre o bizarro, o melodrama e o nonsense, sempre à beira do abismo estético. Alguns dos problemas levantados pelos que se debruçaram sobre o filme: quais as intenções reais de Aldrich?  A atmosfera camp foi premeditada? A atuação estapafúrdia de Kim Novak  foi  igualmente intencional, visando, justamente atingir um efeito errático ( na falta de  outra palavra)?  O filme de Aldrich é mesmo uma estátua sem braços, retirada do porão dos filmes fracassados e esquecidos de Hollywood, desafiando com  sua petulante extravagância  como aquela antiga e milenar esfinge, quem dela se  aproxima

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Violent Midnight - 1963

Esse negócio de um filme puxa outro é mesmo uma curtição e fico mesmo feliz quando estou caçando um determinado filme, ou simplesmente pesquisando alguma coisa, e trombo com um como este aqui, que veio assim por acaso, e felizmente foi até fácil de achar, depois que me despertou a curiosidade. O nome nos créditos de Del Tenney poderia talvez haver despertado interesse antes, mas realmente o filme não tinha me atraído. Aqui ele está nos bastidores apenas, enquanto produtor. Como diretor foi um dos muito picaretas infames e sensacionais que inundaram os drive-ins nos anos 60 com tosqueiras monumentais e absurdas, da mesma cepa de Ron Ormond, Al Adamson, Ted V.Mikels e muitos, muitos outros.
A direção de “Violent Midnight” ou Psychomania, como é conhecido também, coube a Richard Hilliard, com apenas 6 filmes no currículo, todos nessa esfera B e exploitation. Evidente que a inspiração do filme veio de “Psicose’ de Hitchcock, lançado alguns anos antes. Mas contem muitos elementos originais e que prenunciariam, por exemplo, o “giallo” italiano e os filmes slasher, que ainda fazem sucesso, tipo “Pânico”, para citar um recente.
Elliot(Lee Philips) é um milionário, veterano da guerra da Coréia, vive recluso em uma casa de campo, e dedica seu tempo a pintar mulheres nuas. O retorno da irmã, que não via há muito tempo, desde que o pai morrera num tiro acidental durante uma caçada, parece uma oportunidade para o misantropo artista voltar a perceber a beleza do mundo ao redor. No caso, belezas, pois a irmã vai morar num colégio interno de garotas, uma das quais é chamada de Lolita. Dolores, modelo dos quadros de Elliot, é assassinada de maneira brutal por um psicopata. As suspeitas recaem sobre Elliot e também sobre o namorado da moça, um funcionário da lavanderia e tipo rebelde sem causa, presença comum nos filmes B daquela época, interpretado aqui por James Farentino. Outro suspeito dessa morte e das que se seguem, é o professor da escola, Melbourne, um tarado clássico que dedica seu tempo a espionar as mocinhas nuas no vestiário ou quando estão nadando em um rio nas cercanias da escola. E entre as garotas se destaca a lépida e sexy Alice (Lorraine Rogers), maior responsável por aumentar a voltagem erótica do filme. Para os padrões da época o diretor fez o que pode para explorar a sensualidade das atrizes, e deixa o filme com cara das produções sexploitation que seriam comuns posteriormente. Um thriller com boa atmosfera, violento e sexy, uma bela fotografia em preto-e-branco, excelente trilha sonora misturando jazz swingado e rock’roll, além de oferecer um painel convincente de uma pequena cidade do interior da Nova Inglaterra nos anos 60. Ou seja, Richard Hilliard, realizou um filme que merece atenção no panorama do filme B dos anos 60.


link do filme abaixo:
http://www.fileserve.com/file/A7NZDet/Violent_Midnight_1963.avi

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

The Female Jungle - 1956

Um pequeno filme noir, mais lembrado por marcar a estreia nas telas de Jane Mansfield. Alguém ainda se recorda dela, ou pelo menos alguém com menos de 50? Duvido.
Reza a lenda que ela inclusive teve que pagar 150 dólares pela participação. E como o resultado de bilheteria não foi lá essas coisas, ela voltou à profissão de vendedora de pipoca em cinema, só reaparecendo nas telas pelas mãos mágicas de Frank Tashlin algum tempo depois. Vendida como uma imitação de Marylin Monroe, o sucesso foi fugaz, culminando no fim trágico em um acidente de automóvel. Nessa altura estava novamente confinada aos papéis em filmes Bs obscuros. Teve, no entanto, a glória de protagonizar o primeiro nu em um filme comercial americano, já no declínio da carreira. Mas o filme que lembro aqui é mais do que apenas uma memorabília cinematográfica, tem no elenco Lawrence Tierney, outra lenda de Hollywood, pelos seus excessos fora da tela. Esse por incrível que pareça, deve ser lembrado ainda por cinéfilos mais jovens, afinal atuou em “Cães de aluguel” de Tarantino, e continuando com as lendas, o ator quase deu uns sopapos no jovem diretor incauto. Tierney foi um dos maiores bebuns do cinema, e causou tanta confusão, que até em um jornalista que pretendia escrever uma biografia autorizada deu uns sopapos e ela nunca saiu.
Em “Female Jungle “ ele está à vontade, pois interpreta um detetive alcoólatra, que estava a dois dias enchendo a cara em um pub. O filme marca sua volta aos estúdios, depois de um hiato na carreira, por motivos óbvios já citados acima. Uma produção barata e rápida, rodada em apenas 10 dias. Foi ainda o único noir produzido pela American International Pictures, produtora de Roger Corman, e lançado em programa duplo com um western. O título inicial era “Hangover”(Ressaca), mas foi descartado pelos produtores.
E ressaca e álcool são os elementos que movem este filme. A sua ação gravita em torno de um pub, e se passa apenas em uma longa noite, após o fechamento do pub. Uma atriz é morta na saída do pub por um assassino misterioso. Os suspeitos logo aparecem e um deles justamente nosso policial interpretado por Tierney, que estava no pub, e não se lembrava de bem do que havia feito na noite, apenas que fora visto saindo com uma loura, e estava com um corte no braço. Entra em cena John Carradine, suspeito óbvio no papel de um colunista elegante e sinistro, amigo e amante infeliz da atriz assassinada. Outro elemento importante no imbróglio é um caricaturista que no momento do crime estava no pub desenhando os clientes. O rapaz casado com uma das garçonetes do lugar tinha, no entanto Candy Price (Jane Mansfield) como amante, que por sua vez tem seu caso com o policial suspeito. Toda a trama se confina ao pub já fechado, e os becos ao seu redor, numa trama claustrofóbica e tensa.
Bruno VeSota teve uma longa carreira como ator no cinema, quase sempre em produções B, e só dirigiu 4 pequenos filmes.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

La Ragazza Dalla Pelle di Luna - 1973

Alguns filmes só sobreviveram ao limbo dos filmes esquecidos, por algum aspecto. Eu, mesmo, confesso que só me aproximo de certos filmes motivados por alguma coisa especial: trilha sonora, uma atriz, o diretor, ou outro detalhe qualquer. No caso desse filme do diretor Luigi Scattini, parece que ele só sobrevive de certa maneira, por causa da sensacional trilha sonora de Piero Ulimani: o tema está na série “Easy Beat”, que recompila grooves italianos dos anos 70, por exemplo. Não me recordo de haver buscado um filme por causa de uma trilha, acho que só a “A Virgem de Saint Tropez”, foi esse o caso, mesmo assim porque cheguei a achar que este filme nem existia de fato, e somente a trilha do nosso Hareton Salvanini sobrevivera. Aliás, LP da trilha vale ouro, impossível de achar, e o filme, existe sim, até está em meus planos resenhá-lo até porque é ambientado no Brasil, dirigido por um francês. Mas o filme é muito fraco, e na medida do possível, prefiro destacar filmes que me agradaram de alguma maneira. E meu filme italiano da vez, não se se destaca só pela trilha, razão da sua sobrevida, meio agônica, é verdade na rede. Nunca saiu em DVD, talvez exista em VHS na Europa e nos sites de compartilhamento dá trabalho baixá-lo. Como eu disse, este filme é muito mais do que uma trilha com imagens ruins.
Alberto (Ugo Paglia), um engenheiro, e Helen (Beba Loncar), uma fotógrafa, formam um casal comum no estágio do casamento em que o tédio é a tônica. Numa tentativa de reacender a velha chama perdida, o marido decide umas férias inesperadas na ilha de Seychelles. Tudo parecia estar melhorando quando chegaram, até que uma nativa, Simone (Zeudi Araya) entra em cena e Alberto se enamora perdidamente; Helen, por sua vez, dirige então suas atenções para Giacomo, um pescador e escritor de livros de aventuras, um dos poucos brancos moradores da ilha. Mas acontece o inesperado: ela se enamora também, pela bela nativa negra. Estava desenhado um triângulo amoroso, ou quarteto, na ilha paradisíaca. Como pano de fundo cenas documentais que revelam um pouco do cotidiano da época na ilha, e uma sequência de pesca de tubarões, politicamente incorreta para os padrões atuais. O clichê de elementos mágicos e maldições, presentes em qualquer filme que retrata sociedades mais primitivas está presentes na figura da velha meio feiticeira, e mãe de Simone. Mas sabiamente o diretor prefere se concentrar nas relações entre o casal e a nativa, inserindo questões sobre uma vida mais simples, longe do pesadelo ocidental, e como todo italiano que se preze, deixa a bela morena, o mais tempo possível, nua em cena.
Pela sua semelhança com Laura Gemser, estrela dos filmes de Joe D’Amato na década de 80, muitos veem nesse filme uma cópia dos filmes do diretor de “Black Emanuelle” e outros filmes com ela. Bem, estes foram realizados, como eu disse, na década seguinte, portanto é fácil concluir que a influência é inversa. Jess Franco também foi citado, como outra possível influência, mas é o mesmo caso, pois o espanhol só investiria no filão sacanagem e ilhas paradisíacas posteriormente. Zeudi Araya estrelou mais dois filmes com Scattini - foi descoberta por ele durante um comercial de chocolate- foi Miss Etiópia em 1969 e posou para a Playboy italiana em 1977, abandonando a carreira de atriz e se dedicando à produção. E a julgar por algumas fotos que conferi continua linda com cinquenta e poucos anos.
Luigi Scattini relembrou em entrevista que teve a ideia do filme ao ouvir a lenda, durante uma viagem no oceano Índico, de uma mulher de pele de lua na ilha de Seychelles. Intrigado foi até lá à procura da moça e só encontrou mulheres feias. Voltou à Itália só com o título e ao conhecer Zeudi levou adiante a realização. Um filme, que como eu disse, merece uma lembrança não apenas pela sua trilha.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

The adventures of Hajii Baba - 1954

Meu primeiro post de novembro deveria ser dedicado, talvez, apenas a um amigo que conheci no mundo do cinema e, que se foi cedo desse mundo ontem, dia 01. Uma triste notícia. Não encontrava Marcelo Castilho Avellar, pessoalmente, há muitos anos, mas sempre acompanhava suas críticas quase diárias no Estado de Minas. Mas, houve um tempo entre os meus 20 e 27 anos, que encontrávamo-nos ,quase que diariamente ,ali nas redondezas do Maletta, Cine Metrópole, locais perto da nossa antiga sala de reuniões do CEC, além, é claro, do Palácio das Artes, e na redação do EM, onde editávamos a Seção de Cinema. Marcelo era culto, foi a primeira pessoa que conheci com tantos conhecimentos de Wagner, cinema americano e Shakespeare. Era um cultor do apolíneo e da arte clássica, mas nunca desprezou a vanguarda( montou Ionesco ) e sempre levou com bom humor as discussões sobre cinema comercial americano, que considerávamos alienado e cinema de arte europeu, para muitos de nós, naquela época, muito mais profundo e blá-blá. Tempos de papos cabeças no Rococó, Lua Nova ou Lucas. Apesar de erudito, gostava e conhecia os quadrinhos, o pop e nunca negou valor aos blockbusters, sendo capaz de enxergar motivos shakespearianos em “Thor",para citar um exemplo recente.Mas, como disse não vou me estender sobre sua memória. A melhor homenagem a ele é lembrar um filme do cinema que ele tanto amava e conhecia. Nem sei se Marcelo gostava desse filme, ou que sequer o conhecesse: “As Aventuras de Hajii Baba”. Se sim olharia para ele, daria uma risada, diria que eu era um maluco por achar alguma qualidade no filme. Ou quem sabe, diria que era um filme divertido e tolo. Se dissesse isso, estaria com a razão. O filme, dirigido por Don Weiss, do segundo time dos diretores de filme B americano, e estrelado por John Derek, é uma adaptação do romance homônimo de James Morier. Infiel, muito infiel, mas divertido e tolo. O livro, um clássico obscuro da literatura inglesa retratava as aventuras de um barbeiro lá pelo séc. 18. O filme, ao invés disso, prefere ir na onda, já naquela época, algo fora de moda, dos filmes que retratavam o oriente como só Hollywood retratava: um oriente de pacotilha, falso, mas com seu charme. Mas já não havia mais Maria Montez e Jon Hall, astros dos filmes orientais da década de 40: é uma produção B, que até disfarça bem o orçamento exíguo. John Derek, não era grande coisa como ator, e parece mais um astro pop canastrão perdido num cenário de um filme oriental hollywoodiano de segunda categoria. Opa! ! Mas nosso filme é assim mesmo não? Mas em meio a tanta fantasia e exotismo de quinta categoria, uma trilha estapafúrdia embalada-por um mantra cantado por Nat King Cole -, temos aqui e ali diálogos irônicos e, sobretudo, um erotismo diáfano e incongruente. A sequência final redime tudo que o filme poderia ter de pífio e tolo, com sua sensualidade colorida. O detalhe é que o diretor encheu o elenco de mulheres que naqueles tempos posavam para a Playboy, entre outras revistas masculinas americanas. Princesas atrevidas, criadas abelhudas, guerreiras amazonas no deserto da Pérsia (?), mulheres sempre em trajes sumários em um hipotético ambiente muçulmano: é um filme em que a presença feminina domina completamente , destacando-se a presença sexy, como nunca, de Elaine Stewart ( o filme é dela), e nosso herói é tão somente um títere picaresco e um pouco safado nas maõs delas.