sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Angel of Destruction- 1994



Este filme talvez seja outra (mais uma) desculpa – sempre esfarrapada - para lembrar uma das rainhas do filme B, talvez a maior de todas, dos anos 90. Maria Ford, que está na casa dos 50 agora, e ainda em atividade na TV, ganhou lugar cativo nos fãs com uma série de filmes baratos, rápidos, geralmente de ação, erótico, terror, ou ficção científica. Generosamente sempre fez questão de mostrar os atributos quando assim exigia o roteiro. Outro detalhe: ela entende mesmo de artes marciais e não dubla suas cenas, além de ser excelente dançarina( foi stripper em Las Vegas). Boa parte dessas produções Bs ,onde atuou ,foi realizada diretamente para o mercado de vídeo. Os anos dourados da grindhouse e exploitation já eram lenda nos anos noventa, mas o surgimento do VHS deu sangue ao filme B na Itália, EUA e outros países. E nesse contexto que se situa este filme que escolhi para lembrar essa lourinha gata brava . Ainda não vi todos os filmes que estrelou (devo ter uma dezena ou mais), mas pelo título resolvi arriscar e confesso que me diverti bastante. O filme como ele pode ser visto hoje pelo espectador surgiu de um contratempo sui-generis. Inicialmente seria estrelado por Charlie Spradling, que interpreta a irmã da personagem vivida por Maria Ford. Porém como ela não aceitou fazer uma cena em que tinha que lutar vestida só com uma calcinha os produtores decidiram “matar “ seu personagem, reescreveram o roteiro, e convocaram Maria Ford, que se tornou a heroína da história. A trama recicla dois sucessos da produtora de Corman : “Angelfist”, dirigido por Ciro H. Santiago, e “Blackbelt” do mesmo diretor desse filme, Charles Philip Moore. Na verdade é quase uma refilmagem desse último realizado dois anos antes. Como não curtir um filme em que a heroína é obrigada a enfrentar um bando de vilões vestida apenas com uma sexy calcinha vermelha? A cena, aliás, lembra a sensacional sequência do “pink” japonês “Sex and Fury” com Reiko Eike lutando completamente nua, sob a neve. Foi esta a sequência que motivou o quiproquó com Charlie Spradling, diga-se de passagem. Em mais de um sentido este filme revela influências do cinema oriental dos anos 70 japonês e de Hong Kong. Como nos gloriosos anos setenta as filmagens foram realizadas nas Filipinas, com produção do grande Ciro H.Santiago e Roger Corman. Maria Ford é Jo, uma policial, cuja irmã Britt - uma policial durona também – é brutalmente espancada e morta por um brutamonte. Claro que ela parte então no encalço de Bobby, o psicopata frio que matou a irmã, e que colecionava corpos de mulheres como quem colecionava filmes vagabundos: depois de fazer sexo com as incautas -vestidas de noivas- as matava com porradas e arrancava o dedo onde previamente colocara um anel de noivado. Muito singelo, mas considerando que ele era um mercenário ex-combatente do Vietnã, perfeitamente explicável. Para chegar até este simpático sujeito nossa heroína e musa mergulha no universo do showbusiness fuleiro, com cheiro de fracasso, quase da prostituição. No centro desse mundo tosco encontra Delilah(Jessica Mark) uma cantora bissexual que realiza um show strip lésbico & sadomasoquista, que já não atraia quase ninguém. Era sustentada por um gangster gordo e escroto cujos negócios incluíam tráfico de drogas, proxenetismo e outras coisitas mais, além de uma gravadora. Jo vai trabalhar como guarda-costas da artista. O psicopata nutria uma fixação doentia pela cantora e além de segui-la mandava-lhe presentinhos que incluíam dedos decepados. Mais romântico impossível. Outro momento estupendo acontece: ameaçada pelo vilão, que rapta a namorada e partner da cantora, Jo é obrigada a fazer um número de strip-tease. Nonsense e divertido. Ao que parece boa parte dos filmes de Maria Ford incluem cenas assim ou se passam nesse ambiente, pelo que constatei. Policial disfarçada de stripper, aliás, seria quase um sub-subgênero da exploitation tal a quantidade de filmes realizados nos anos 80 nessa linha. Mas o gênero do filme é mesmo “gostosa pelada com uma pistola fumegante”. E dentro dessa linha o filme é uma ótima e deliciosa farra. Observando o ano do filme constato que este é, provavelmente, o mais “novo” que resenhei aqui no blog considerando o ano em que foi realizado. Para os interessados existe ele no pirate bay: http://thepiratebay.se/torrent/6936728/Angel_of_Destruction_(1994)___Maria_Ford__

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

La Lupa Mannara - 1976


Um filme que filme assisti pela primeira vez em uma edição americana, quando morava nos EUA e veio num pacote com 50 dvds a preço irrisório. Por lá essas edições são comuns: geralmente são amontoados de filmes cujos direitos autorais venceram. Com preço tão baixo é natural que no bolo se salvem digamos assim a metade, e a qualidade é o item pior infelizmente, principalmente quando se trata de filmes europeus os anos 60 e 70.´É o caso desse dublado em inglês e cheio de cortes. Felizmente obtive a versão integral e pude apreciar mais uma vez a esplêndida Dagmar Lassander, além da pouco conhecida Annik Borel. E o bom é que tem no youtube. Corram enquanto ainda está lá. O acervo do canal está excepcional, apesar da qualidade não ser perfeita em alguns casos, mas no caso desse filme a cópia é de boa qualidade e parece que sem cortes. Metragem em filmes europeus dos anos 70 é um problema sério, controverso, e renderia artigos. O diretor é o subestimado e esquecido Rino Di Silvestre, um dos maravilhosos e mais obscuros “picaretas” da geração de ouro do eurotrash italiano. Infelizmente as oportunidades na direção foram poucas - somente 8 filmes-, o que não o impediu de deixar ótimos e absurdos filmes em gêneros variados. Este o único que obteve certa ressonância. O tema da licantropia foi bem explorado por espanhóis, eslavos, mexicanos e americanos com contribuições interessantes à lenda do bichão. Mas os italianos que tanto fizeram pelo horror e fantástico, a partir de Bava, Polselli e outros, deixaram o lobo de lado. “En Passant”, não recordo se os ingleses abordaram também o tema. O título da versão americana tenta enquadrá-lo na licantropia. Mas o fato é que o filme vai além (ou aquém, dependendo do ponto de vista) e o tema aparece subjacente. A heroína, a mulher loba, do título é a francesa Annik Borel, de carreira efêmera no cinema europeu(10 filmes no total). O diretor declarou que só a escolheu para o papel pelas feições que lembravam uma loba. Uma bela mulher, e que se tivesse encontrado um Jess Franco teria alcançado maior destaque na galeria das divas do exploitation. Mas e o filme, é ou não é de lobisomem? Bem, o início, após uma abertura sensacional com uma mulher dançando nua em volta de uma fogueira, parece que vai enveredar por mais um terror gótico de época, que fez glória do cinema italiano. Surgem então os camponeses, aprisionam a mulher lobo e a mandam para a fogueira. Os tempos não eram fáceis para quem escolhia meios alternativos de vida. Salto para a idade contemporânea e encontramos Daniele, descendente da mulher-loba, riquíssima, morando com o pai em um castelo no campo. A irmã, interpretada por Dagmar Lassander, aparece para a uma vista em companhia do marido, e então o espectador começa a se dar conta que a moça não regulava muito bem e apresentava sérios problemas de sexualidade. Para os psicanalistas, a definição seria uma histérica. Estuprada aos 15 ,tomara aversão ao sexo, sem, no entanto deixar de ter uma fascinação voyeurística pela coisa.Para complicar ela se julgava possuída pelo espírito da antepassada e não tarda em mostrar as garras, sendo o cunhado o primeiro objeto de consumo a ser estraçalhado numa noite de lua cheia. Segue-se uma internação, choques, camisa-de força- o trivial da psiquiatria cinematográfica- até a fuga, não sem antes cometer outra morte. E o inesperado acontece na trama e na vida da nossa, digamos, heroína: conhece um sujeito legal, dublê, e que morava, numa cidade fantasma, de fato um velho set de westerns spaghettis abandonado .E pela primeira vez ela se entrega e descobre o amor, a loba se despe da pele e se transforma numa mocinha boa, carinhosa e que ficava cuidando da casa enquanto o lover trabalhava. Mas felicidade será infelizmente estragada por um trio de malandros, que estupram Danielle e matam namorado. Não é spoiler ! Como se percebe pela sinopse está claro que Rino Di Silvestre colou uma série de gêneros exploitations em um só filme, sem muito nexo. O resultado não poderia deixar de ser desigual. E daí? Pergunto eu. Com todos os prós trata-se de uma legítima tosqueira fascinante e deliciosa. Para os fãs de Tarantino assinalo que o filme foi exibido no festival organizado pelo cineasta em 1996, na cidade de Austin, no Texas, em uma exibição surpresa à meia noite. O sucesso foi tanto, que a partir de então a sessão passou a ser apelidada de “sessão da mulher loba”.

sábado, 2 de fevereiro de 2013

Adrift aka Touha Zvaná Anada - 1970

Em meus passeios pelas cinematografias de países tidos como periféricos ou exóticos ainda não tinha me aventurado aqui no blog pelo cinema do leste europeu. Um pecado, tendo em vista que gosto demais dessa outra Europa: cinema polonês (Zulawski , Has e outros), húngaros, tchecos, romenos, russos e companhia ltda. Janos Kadar foi nome dos mais importantes do cinema do leste europeu. De origem húngara, realizou filmes na antiga Checoslováquia, um deles era exibido regularmente nos bons tempos dos cineclubes: “A Pequena Loja da Esquina”. Filme tido por muitos como o melhor de todos os tempos na cinematografia Tcheca. A invasão russa liquidando coma Primavera de Praga e o forçou a imigrar para os EUA. Boa parte dos seus filmes foram , na verdade, dirigidos em parceria com Elmer Klos. É o caso desse aqui que relembro, e do qual nunca tinha ouvido falar até pouco tempo. Aliás, encontrei poucas referências na rede sobre o filme. Mas curiosamente ele é facilmente encontrado(ainda) no youtube, em cópia legendada em inglês. E que tudo indica a única. Pelo visto o filme não se popularizou ao contrário de outros exemplares gerados na new wave checa nos anos 60, que revelou Milos Forman, entre outros nomes. Qual a razão? Creio que é um filme que não se enquadra no modelinho pseudo-social que era apreciado pelos cinéfilos brasileiros cineclubistas nas décadas de sessenta e setenta, ao contrário dos filmes de outros filmes da Primavera de Praga. É só uma hipótese, que fique bem claro. O filme passa ao largo de questões políticas da época, privilegiando o erotismo em uma narrativa experimental. A trama é ambientada em uma realidade contemporânea, pois há uma cidade moderna e urbana, mas os personagens se movem em uma região rural, primitiva ,quase mágica e, obviamente, irreal já naquela época. Baseado em um romance clássico da literatura húngara do autor Lajos Zilahy, infelizmente ainda inédito  em português, e levado ao cinema anteriormente nos anos 40, diz a wikipedia. As filmagens foram interrompidas pela invasão soviética em 1968 e só retomadas posteriormente na Suécia já em 1970. A estreia somente em 1971 nos EUA, sem repercussão. Uma história repleta de percalços que contribuiu muito para o seu olvido. Um detalhe curioso na produção: foi uma parceria tcheco-americana, fato incongruente. Isso explica provavelmente a presença no elenco de Paula Pritchett, playmate e modelo de vasta,fumegante e devastadora (sobram adjetivos) beleza, aqui em seu único papel principal. A Afrodite só participou de dois outros filmes, e mesmo assim como figurante.
Ela é a Anada, do título original Tcheco, uma mulher que surge das águas do Danúbio, qual uma sereia, misteriosa, e falando uma língua desconhecida. Yanos (Rade Markovic), um rude pescador a salva das águas e a leva para casa. A esposa, a bela e simples Zuska (Milena Dravic) a acolhe com simpatia. E o triângulo amoroso não demora a acontecer. Em linhas gerais é esta a trama. Mas o que fascina e encanta no filme é a desconstrução narrativa, sutil, que deixa margens à ambiguidade de toda a história narrada em flashback pelo pescador Yanos. Até onde vai a verdade? Não seria tudo uma patranha de bêbado contada numa roda de fogueira aos amigos camponeses? E quem era Adana? Zuska e ela teriam uma relação sáfica? Ana teria também um affair com o playboy local? E o filho do pescador, não seria ele que teria uma relação homossexual com este mesmo playboy? Poético, experimental ( mas nunca chato, que fique bem claro) em sua narrativa quase circular e absolutamente fascinante. Outro destaque fica com a excepcional trilha sonora de Zoenek Liska. Como eu disse no início da resenha: o filme está disponível no youtube, completo, com legendas em inglês.