Falar que este filme é a obra-prima de Frank Borzage seria uma leviandade da minha parte, afinal ainda estou descobrindo a obra – imensa – desse diretor americano. Começou no cinema mudo e fez carreira até o fim dos anos 50, ou seja, tenho muito filme ainda dele para descobrir e posso mudar essa afirmativa, e de resto nada mais chato que afirmativas. Mas este filme é maravilhoso, e se não é a obra mestra de Borzage, fiquemos a imaginar então o nível de suas obras-primas. Já no final da década de 40 quando dirigiu este filme há muito Borzage deixara seu auge criativo, segundo os críticos: seu pique artístico teria sido do cinema mudo até o final da década de 40.
O filme é classificado por muitos como um filme noir. Sim, temos um crime, temos luzes e sombras, temos o sentimento de culpa. Mas não temos a mulher fatal, não temos o mocinho, o cara mal, não temos o cinismo e o desencanto típico do filme noir, muito menos o ambiente urbano soturno. A história se passa em uma pequena cidade do sul dos EUA nos anos 30. Temos apenas um rapaz comum Danny (Dane Clark), que carrega um peso nas costas, uma marca medonha: o pai foi um assassino, condenado à morte, e todos na cidade fazem questão de jogar isso na sua cara desde quando era um garoto. Uma letra escarlate ou uma chaga de fogo que o persegue e que o leva numa briga a matar acidentalmente um rapaz, o playboy local, rival da sua paixão, Gilly (Gail Russell) . A estética expressionista alemã nunca esteve tão presente neste filme em seu jogo de luzes e sombras, que pontua o calvário do rapaz. Esplêndida sequência inicial, cinco minutos praticamente sem diálogos, que demonstram todo seu pathos expressionista. A herança de Murnau, de quem Borzage herdou o estilo: é evidente que o filme deve muito à “Sunrise”.
O crítico Andrew Sarris classifica o diretor como uma dos mais elusivos da história do cinema. E no livro “The American Cinema” ele lembra que :“ Muitos dos projetos de Borzage, especialmente no fim de sua carreira, foram indiscutivelmente triviais na concepção, mas a personalidade do diretor nunca vacilou, e quando a gloriosa oportunidade de ‘Moonrise’ se apresentou Borzage não se sentiu velho ou cansado”.
O filme realizado em condições modestas de orçamento foi um fracasso, atribúido a dificuldade de enquadrá-lo em um determinado gênero. O estúdio tentou vende-lo como um drama romântico, mas a estética expressionista e ausência de um herói dentro dos arquetipos hollywoodianos afastaram público e crítico. O filme apresenta detalhes interessantes: é um dos raros filmes do período a apresentar um ator negro, Rex Ingram, em papel de destaque e de maneira positiva: ele funciona como a consciência de Danny. Foi inclusive tido como o melhor papel escrito para um ator negro até então. O personagem quase filosófico do xerife, que procura descobrir o criminoso é outro dado curioso. Mas é na sua mise-en-scene romântico-expressionista que o filme se transfigura: Borzage foi sempre um saudosista dos tempos do cinema mundo, onde a expressão visual era essencial, e em “Moonrise” mais que em outros de seus filmes pode dar vazão ao seu fascínio. “Com os cartões de título substituindo o diálogo, poderia ter sido o maior filme mudo jamais feito por Borzage”, observou um crítico americano.
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