sexta-feira, 30 de março de 2012
Au rendez-vous de la mort joyeuse - 1973
Crescer à sombra de um monstro sagrado não é fácil. Exemplos de artistas que herdaram o talento dos pais não são assim tão comuns. É fato, não sei ao certo – de repente sempre foi assim - que se alguém resolve conferir a filiação de um artista vai descobrir que o fulano é filho de sicrano famoso. Nosso Brasil então a coisa parece até capitania hereditária, principalmente na música e no cinema, não é mesmo? Mas existem exemplos de filhos que conseguiram achar um lugar ao sol e sair da sombra do gigante que o colocou no mundo. O diretor Jean Renoir, é um bom exemplo, filho que era do pintor Renoir. No cinema temos Jacques Tourneur, filho de um diretor que famoso nos anos 30: mas quem hoje se lembra dele, Maurice Tourneur? Charlotte Gainsbourg parece que pegou algum talento dos pais sensacionais e vai dando seus passos . A divagação, meio confusa, está se dando a propósito do venerável e mitológico Luis Buñuel. Eu, particularmente o tive – e tenho, menos hoje talvez – como um ídolo: tinha tudo é quanto livro sobre e dele, tenho e vi todos os filmes, enfim, uma obsessão. Filósofo, poeta, muito além de um diretor. E curiosamente, nunca dei muito bola para a família, ainda que tenha chegado ao ponto de ler a autobiografia da esposa . E dia desses fuçando umas listas de melhores filmes franceses de terror de todos os tempos me deparei com o nome Buñuel, no meio. E claro que, não era o pai, mas o filho, que eu sabia desde há muito que tinha carreira própria como diretor. Ai fiquei espicaçado pelo demônio da curiosidade, baixei o filme aqui em questão, de um belo título em francês, aliás, e fui conferi-lo. Antes lembrar que a sombra gigantesca do pai monstruoso pesou sim na carreira de Juan: ele só dirigiu quatro longas para o cinema e se dedicou à TV francesa até 1996; afora isso se limitou a percorrer festivais pelo mundo apresentando os filmes...do pai. Começou a carreira no cinema com outro monstro: Orson Welles, como interprete e assistente, nas filmagens do inacabado “ Dom Quixote”; posteriormente trabalharia com o pai em alguns dos seus clássicos até encarar a direção, com um curta dedicado aos tambores de Calanda, terra natal do pai. Mas ao contrário dele , Juan optou pelo cinema de gênero, e no caso aqui, o fantástico e o terror. Absorveu é fato muitos elementos da cinematografia paterna. Assim como nos filmes do pai, prescinde da música para criar efeitos. Aliás, ela só surge no filme indiretamente quando a garota está ouvindo um rádio. Buñuel nunca foi muito fá de música em seus filmes, até pelo fato de que era meio surdo. A narrativa começa lentamente, estudada, concentrando-se em pequenos e ,aparentemente, detalhes banais - cordas, lama - , que só ganharão significado posteriormente. Uma família intelectual - o pai, artista, e a esposa, romancista, e o um casal de filhos – uma garota bonita adolescente e um menino de seus 9 anos, pentelho – mudam-se para um paraíso no campo. Uma bela mansão, quase um castelo. O sonho burguês de tranquilidade para criar e descansar tornado realidade. Mas não tarda muito e ela começa a ser quebrada por fenômenos inexplicáveis, mais e mais assustadores. Normalmente personagens em filmes de terror de casas mal assombradas, estupidamente nunca fogem. Não no filme : a família cai fora assim que fica claro que a casa era um pesadelo. Voltam para Paris. E entra em cena Peron, amigo da família, apresentador de um programa de variedades, que resolve ir até lá e realizar uma matéria investigativa sobre casas mal- assombradas. Leva com ele a equipe de filmagem, um deles interpretado por Gerard Depardieu, naquela época ainda sem o renome que alcançaria. Tudo parece tranquilo, mas eis que a filha do casal, Sophie (Yasmine Dahm) regressa inesperadamente á mansão. E na mesma noite um padre surge, guiando 10 meninas meio estranhas, pedindo abrigo na casa. A partir daí os acontecimentos surreais são deflagrados, cada vez mais bizarros e histéricos, sempre inexplicáveis. Sabiamente o terror é baseado na sugestão. O senso do terror e do mistério no cotidiano. Atmosfera onírica,gótica, um conto de fadas para adultos, inquietante e opressivo. A realidade mágica. A narrativa escapole de efeitos assustadores fáceis, caros aos americanos e italianos, por exemplo, com a economia visual herdada do pai genial. Aqui e ali o diretor agrega e deixa pistas para o espectador: é evidente a um olhar mais atento que temos uma metáfora da puberdade da adolescente, a explosão da sexualidade. Em algum lugar achei um jogo de palavras com uma obra do pai que serviria perfeitamente para este filme: o fantasma da puberdade. Filho de peixe, peixinho é: e piadas anticlericais não podiam faltar. O padre – a cara do Lacan, aliás – era um exorcista, e inutilmente tenta espantar o mal da casa. E em uma cena ambígua é visto, pelo buraco da fechadura, deitado na cama abraçado com duas garotinhas. O filme, não se esgota em uma única visão, dada a riqueza de sugestões que oferece. Uma abordagem original , sem dúvida, da velha história de uma casa mal-assombrada. Para os interessados tem torrents dele no pirate bay.
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