Em meus passeios pelas cinematografias de países tidos como periféricos ou exóticos ainda não tinha me aventurado aqui no blog pelo cinema do leste europeu. Um pecado, tendo em vista que gosto demais dessa outra Europa: cinema polonês (Zulawski , Has e outros), húngaros, tchecos, romenos, russos e companhia ltda. Janos Kadar foi nome dos mais importantes do cinema do leste europeu. De origem húngara, realizou filmes na antiga Checoslováquia, um deles era exibido regularmente nos bons tempos dos cineclubes: “A Pequena Loja da Esquina”. Filme tido por muitos como o melhor de todos os tempos na cinematografia Tcheca. A invasão russa liquidando coma Primavera de Praga e o forçou a imigrar para os EUA. Boa parte dos seus filmes foram , na verdade, dirigidos em parceria com Elmer Klos. É o caso desse aqui que relembro, e do qual nunca tinha ouvido falar até pouco tempo. Aliás, encontrei poucas referências na rede sobre o filme. Mas curiosamente ele é facilmente encontrado(ainda) no youtube, em cópia legendada em inglês. E que tudo indica a única. Pelo visto o filme não se popularizou ao contrário de outros exemplares gerados na new wave checa nos anos 60, que revelou Milos Forman, entre outros nomes. Qual a razão? Creio que é um filme que não se enquadra no modelinho pseudo-social que era apreciado pelos cinéfilos brasileiros cineclubistas nas décadas de sessenta e setenta, ao contrário dos filmes de outros filmes da Primavera de Praga. É só uma hipótese, que fique bem claro. O filme passa ao largo de questões políticas da época, privilegiando o erotismo em uma narrativa experimental. A trama é ambientada em uma realidade contemporânea, pois há uma cidade moderna e urbana, mas os personagens se movem em uma região rural, primitiva ,quase mágica e, obviamente, irreal já naquela época. Baseado em um romance clássico da literatura húngara do autor Lajos Zilahy, infelizmente ainda inédito em português, e levado ao cinema anteriormente nos anos 40, diz a wikipedia. As filmagens foram interrompidas pela invasão soviética em 1968 e só retomadas posteriormente na Suécia já em 1970. A estreia somente em 1971 nos EUA, sem repercussão. Uma história repleta de percalços que contribuiu muito para o seu olvido. Um detalhe curioso na produção: foi uma parceria tcheco-americana, fato incongruente. Isso explica provavelmente a presença no elenco de Paula Pritchett, playmate e modelo de vasta,fumegante e devastadora (sobram adjetivos) beleza, aqui em seu único papel principal. A Afrodite só participou de dois outros filmes, e mesmo assim como figurante.
Ela é a Anada, do título original Tcheco, uma mulher que surge das águas do Danúbio, qual uma sereia, misteriosa, e falando uma língua desconhecida. Yanos (Rade Markovic), um rude pescador a salva das águas e a leva para casa. A esposa, a bela e simples Zuska (Milena Dravic) a acolhe com simpatia. E o triângulo amoroso não demora a acontecer. Em linhas gerais é esta a trama. Mas o que fascina e encanta no filme é a desconstrução narrativa, sutil, que deixa margens à ambiguidade de toda a história narrada em flashback pelo pescador Yanos. Até onde vai a verdade? Não seria tudo uma patranha de bêbado contada numa roda de fogueira aos amigos camponeses? E quem era Adana? Zuska e ela teriam uma relação sáfica? Ana teria também um affair com o playboy local? E o filho do pescador, não seria ele que teria uma relação homossexual com este mesmo playboy? Poético, experimental ( mas nunca chato, que fique bem claro) em sua narrativa quase circular e absolutamente fascinante. Outro destaque fica com a excepcional trilha sonora de Zoenek Liska. Como eu disse no início da resenha: o filme está disponível no youtube, completo, com legendas em inglês.
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